Um espaço para reinventar Portugal como nação de todo o Mundo, que estabeleça pontes, mediações e diálogos entre todos os povos, culturas e civilizações e promova os valores mais universalistas, conforme o símbolo da Esfera Armilar. Há que visar o melhor possível para todos, uma cultura da paz, da compreensão e da fraternidade à escala planetária, orientada não só para o bem da espécie humana, mas também para a preservação da natureza e o bem-estar de todas as formas de vida sencientes.
"Nós, Portugal, o poder ser"
- Fernando Pessoa, Mensagem.
Escola ainda não contactou pais do aluno que se atirou ao rio
Nem uma palavra de solidariedade. A família merecia maior respeito", lamenta Paula Nunes, tia de Leandro, que assim condena a atitude do conselho executivo da Escola Luciano Cordeiro. Desde o trágico dia que a escola mantém as actividades lectivas regulares, recusa prestar qualquer declaração pública e também não o faz em privado, à família do menino desaparecido. "A mãe foi contactada pela directora de turma, que lhe manifestou todo o apoio, mas a directora de turma não representa a direcção da escola", diz a tia do aluno de 12 anos.
Existem fortes suspeitas de que a criança era vítima de violência continuada por parte dos colegas: a avó relatou um episódio de internamento por uma agressão fora do recinto escolar praticada por alunos da mesma escola e alguns colegas testemunharam que antes de se dirigir ao rio Leandro teria sido novamente agredido.
"Foi o meu filho que o impediu de se atirar da ponte, mas não conseguiu impedir depois que entrasse na água", continua Paula Nunes. "Culpa-se, mesmo não tendo culpa, é terrível." Nenhuma das crianças que estavam com Leandro na altura do seu desaparecimento regressou ainda às aulas. "A escola também ainda não se preocupou em saber porque éw que o meu filho e os outros meninos não voltaram à escola", diz, sublinhando que todas aquelas crianças necessitam de acompanhamento psicológico para tentar "ultrapassar o episódio".
A tia, que tem acompanhado permanentemente os trabalhos de busca, também ainda não viu "no local" nenhum elemento da direcção da escola. "Têm passado por aqui alguns funcionários que gostavam do Leandro, mas não vi nunca o director nem ninguém da direcção."
Ontem, pelo sexto dia consecutivo, prosseguiram as buscas no rio, entre Mirandela e a foz do Tua, mais uma vez sem resultados. Durante uma hora, os mais de cem homens que a coordenação distrital da Protecção Civil mantém no terreno conseguiram manter o caudal do rio baixo, fechando as comportas de um açude a montante, mas nenhum rasto de Leandro foi ainda encontrado. "Os bombeiros têm sido incansáveis. Bem sabem como é importante para a família encontrar o menino, poder fazer-lhe um funeral", comenta a tia.
Ana Fragoso, Público - 08/03/2009.
_______
Que dizer perante esta situação?
O ‘bullying’ é um problema estrutural da escola. A forma como a escola está estruturada, como uma cadeia de montagem onde os alunos se enfileiram por classes – a ‘classificação’ escolar é a primeira forma de estratificação social, há aí um sistema perverso de distribuição de marcas de aceitação social, umas inerentes à instituição escolar, outras dependentes das relações grupais que se estabelecem entre os alunos. É uma engrenagem desumana, avessa ao despontar da individualidade expansiva.
Mas trata-se dum problema que pode ser enfrentado e combatido com eficácia. Mas a sua erradicação só será possível pela destruição da escola da era industrial. Há que repensar os espaços escolares que temos, torná-los mais pequenos, com menos pessoas, mais próximos dos limites óptimos da convivialidade: poucos alunos por turma, poucas turmas por cada ano, um leque etário muito alargado – cada escola deve ter todos os níveis de escolaridade, da pré-primária ao 12º ano.
É necessário também que se cultive a democracia directa, recuperando o sentido da ecclesia da Atenas do período áureo: todos os membros da comunidade educativa devem poder discutir em comum os problemas da escola, em assembleia, olhos nos olhos, assumindo compromissos, estabelecendo regras, construindo projectos, avaliando a execução dos projectos, elegendo representantes e responsáveis.
Se uma escola tiver uma dimensão que não permita juntar todas as pessoas num espaço de discussão, então a sua dimensão ultrapassa os limites do aceitável, há que proceder à sua divisão.
O ideal seria que as escolas nascessem da própria comunidade local. O que permite várias modalidades de organização: desde a educação doméstica, a levar a cabo pelas famílias que queiram e possam assumir este encargo, passando pelas cooperativas familiares ou comunitárias, até chegar às escolas de pendor mais institucional, próximas das que temos hoje, mas entregues às comunidades locais.
Há que devolver a escola à sociedade. Todos os cidadãos devem poder participar activamente na vida escolar, e aqui os pais devem ter um papel decisivo no que se refere à gestão da escola. Isto no pleno respeito da autoridade pedagógica dos professores. Mas há formas de organizar a vida da escola tendo como centro orgânico a vida cultural da sociedade envolvente.
Isto requer que a própria sociedade desperte para a democracia verdadeiramente participativa. O que se pode conseguir através da redefinição do conceito de autarquia local: há que devolver a soberania aos cidadãos e às comunidades de base em vez de investir todos os recursos em corpos burocratizados e partidarizados, geridos de forma ‘artificial’, ou seja, desligada da vida concreta das comunidades locais (muitas delas condenadas a uma existência vegetativa em termos de cidadania verdadeiramente democrática e culturalmente viva – basta falar das enormes urbanizações-dormitório).
A escola pode bem ser considerada um órgão de soberania, uma autarquia local. E todas as autarquias locais devem ser reconfiguradas de forma a poderem ser administradas, o mais possível, através da democracia directa. ‘O mais possível’, porque há ainda um longo caminho a percorrer para que os cidadãos se interessem de forma profunda pela sua actividade política.
Por outro lado, se não é natural que na nossa casa nos sintamos deslocados ou ‘a mais’, o mesmo deve acontecer com os nossos filhos na escola: a escola deve ser uma das nossas casas comuns, um espaço de sociabilidade franca. Os nossos filhos devem sentir-se seguros na escola e isso passa por não se verem tratados como aquilo que não são (ou para o qual não nasceram): meras bestas de aprender o que não requer verdadeira aprendizagem. Só aprende quem se prende a tudo, quem se sabe em comunhão com o universo. Só aprende quem descobre a vida compassiva, quer dizer, quem se sabe ser de partilha.
O Leandro suicidou-se por causa da escola. Foi vítima de bullying e este fenómeno é inerente à escola, não há que deturpar o seu sentido escolar. E esta não é a escola que queremos para os nossos filhos, nem a sociedade que queremos para todos nós. Por este motivo a atitude da direcção da escola do Leandro (a escola era do Leandro, como é de todos nós) não é só execrável: é um espelho da sociedade em que vivemos, uma sociedade discriminatória, cada vez mais desigual. Não restem dúvidas: se o Leandro fosse filho dum senhor juiz ou dum médico, dum engenheiro, dum professor, neste momento não estariam à procura dum cadáver nas margens do rio Tua.
Já estive em conselhos de turma em que se perguntava: ‘O João é filho de quem?’; ‘Sabem quem são os filhos de professores?’; ‘Olhem que o pai da Joana é professor catedrático!’. Os filhos dos ‘outros’ ficam na penumbra. Isto em muitos casos pesa. Os filhos de pais que não têm estatuto social muito dificilmente chegam a medicina. Pode até haver muitas excepções, mas isso não me fará abandonar esta convicção.
E se os alunos forem portadores duma deficiência desafiante (que exija muito trabalho), então a coisa pode tornar-se tétrica. Não em todas as escolas, porque há escolas muito preocupadas com estas situações. Esta situação fica a dever-se à falta de formação dos professores (que, no caso das necessidades educativas especiais é praticamente nula – há professores a trabalhar no ensino especial sem qualquer qualificação académica na área); à sobrecarga dos horários de muitos professores – se tiverem cento e muitos alunos, não conseguem prestar atenção a cada um, o que se torna mais problemático no caso dos alunos com uma grande necessidade de investimento pedagógico; mas também há quem não queria os alunos portadores de deficiência na escola dita ‘normal’ – o que contraria o ideal da escola inclusiva que é um dos sustentáculos da sociedade democrática.
O mutismo da direcção da escola de Mirandela (e de todos nós) provará que o bullying é inerente à escola, à forma como a escola está estruturada – se a escola estivesse mesmo entregue à comunidade local, a quem o seu director deveria prestar contas?
Nos últimos anos o quadro legal que suporta a gestão escolar sofreu mudanças que comprometeram o funcionamento democrático das escolas e promoveram o autoritarismo e o autismo administrativo. Hoje nada é verdadeiramente discutido dentro das escolas. Mesmo um órgão tão importante como o conselho pedagógico está completamente manietado, porque a nomeação dos seus membros depende do director.
Os Leandros não se conseguem fazer ouvir; os pais dos Leandros são tratados com sobranceria por quem se julga cultural e socialmente melhor do que eles. Só os agressores se sentem à vontade na escola. Esses vêem-se protegidos por um muro de silêncio e de indiferença.
E nós continuamos cegos, surdos e mudos. A bem da pasmaceira social. Até quando?
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Escola ainda não contactou pais do aluno que se atirou ao rio
Publicada por
Paulo Feitais
on terça-feira, 9 de março de 2010
Nem uma palavra de solidariedade. A família merecia maior respeito", lamenta Paula Nunes, tia de Leandro, que assim condena a atitude do conselho executivo da Escola Luciano Cordeiro. Desde o trágico dia que a escola mantém as actividades lectivas regulares, recusa prestar qualquer declaração pública e também não o faz em privado, à família do menino desaparecido. "A mãe foi contactada pela directora de turma, que lhe manifestou todo o apoio, mas a directora de turma não representa a direcção da escola", diz a tia do aluno de 12 anos.
Existem fortes suspeitas de que a criança era vítima de violência continuada por parte dos colegas: a avó relatou um episódio de internamento por uma agressão fora do recinto escolar praticada por alunos da mesma escola e alguns colegas testemunharam que antes de se dirigir ao rio Leandro teria sido novamente agredido.
"Foi o meu filho que o impediu de se atirar da ponte, mas não conseguiu impedir depois que entrasse na água", continua Paula Nunes. "Culpa-se, mesmo não tendo culpa, é terrível." Nenhuma das crianças que estavam com Leandro na altura do seu desaparecimento regressou ainda às aulas. "A escola também ainda não se preocupou em saber porque éw que o meu filho e os outros meninos não voltaram à escola", diz, sublinhando que todas aquelas crianças necessitam de acompanhamento psicológico para tentar "ultrapassar o episódio".
A tia, que tem acompanhado permanentemente os trabalhos de busca, também ainda não viu "no local" nenhum elemento da direcção da escola. "Têm passado por aqui alguns funcionários que gostavam do Leandro, mas não vi nunca o director nem ninguém da direcção."
Ontem, pelo sexto dia consecutivo, prosseguiram as buscas no rio, entre Mirandela e a foz do Tua, mais uma vez sem resultados. Durante uma hora, os mais de cem homens que a coordenação distrital da Protecção Civil mantém no terreno conseguiram manter o caudal do rio baixo, fechando as comportas de um açude a montante, mas nenhum rasto de Leandro foi ainda encontrado. "Os bombeiros têm sido incansáveis. Bem sabem como é importante para a família encontrar o menino, poder fazer-lhe um funeral", comenta a tia.
Ana Fragoso, Público - 08/03/2009.
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Que dizer perante esta situação?
O ‘bullying’ é um problema estrutural da escola. A forma como a escola está estruturada, como uma cadeia de montagem onde os alunos se enfileiram por classes – a ‘classificação’ escolar é a primeira forma de estratificação social, há aí um sistema perverso de distribuição de marcas de aceitação social, umas inerentes à instituição escolar, outras dependentes das relações grupais que se estabelecem entre os alunos. É uma engrenagem desumana, avessa ao despontar da individualidade expansiva.
Mas trata-se dum problema que pode ser enfrentado e combatido com eficácia. Mas a sua erradicação só será possível pela destruição da escola da era industrial. Há que repensar os espaços escolares que temos, torná-los mais pequenos, com menos pessoas, mais próximos dos limites óptimos da convivialidade: poucos alunos por turma, poucas turmas por cada ano, um leque etário muito alargado – cada escola deve ter todos os níveis de escolaridade, da pré-primária ao 12º ano.
É necessário também que se cultive a democracia directa, recuperando o sentido da ecclesia da Atenas do período áureo: todos os membros da comunidade educativa devem poder discutir em comum os problemas da escola, em assembleia, olhos nos olhos, assumindo compromissos, estabelecendo regras, construindo projectos, avaliando a execução dos projectos, elegendo representantes e responsáveis.
Se uma escola tiver uma dimensão que não permita juntar todas as pessoas num espaço de discussão, então a sua dimensão ultrapassa os limites do aceitável, há que proceder à sua divisão.
O ideal seria que as escolas nascessem da própria comunidade local. O que permite várias modalidades de organização: desde a educação doméstica, a levar a cabo pelas famílias que queiram e possam assumir este encargo, passando pelas cooperativas familiares ou comunitárias, até chegar às escolas de pendor mais institucional, próximas das que temos hoje, mas entregues às comunidades locais.
Há que devolver a escola à sociedade. Todos os cidadãos devem poder participar activamente na vida escolar, e aqui os pais devem ter um papel decisivo no que se refere à gestão da escola. Isto no pleno respeito da autoridade pedagógica dos professores. Mas há formas de organizar a vida da escola tendo como centro orgânico a vida cultural da sociedade envolvente.
Isto requer que a própria sociedade desperte para a democracia verdadeiramente participativa. O que se pode conseguir através da redefinição do conceito de autarquia local: há que devolver a soberania aos cidadãos e às comunidades de base em vez de investir todos os recursos em corpos burocratizados e partidarizados, geridos de forma ‘artificial’, ou seja, desligada da vida concreta das comunidades locais (muitas delas condenadas a uma existência vegetativa em termos de cidadania verdadeiramente democrática e culturalmente viva – basta falar das enormes urbanizações-dormitório).
A escola pode bem ser considerada um órgão de soberania, uma autarquia local. E todas as autarquias locais devem ser reconfiguradas de forma a poderem ser administradas, o mais possível, através da democracia directa. ‘O mais possível’, porque há ainda um longo caminho a percorrer para que os cidadãos se interessem de forma profunda pela sua actividade política.
Por outro lado, se não é natural que na nossa casa nos sintamos deslocados ou ‘a mais’, o mesmo deve acontecer com os nossos filhos na escola: a escola deve ser uma das nossas casas comuns, um espaço de sociabilidade franca. Os nossos filhos devem sentir-se seguros na escola e isso passa por não se verem tratados como aquilo que não são (ou para o qual não nasceram): meras bestas de aprender o que não requer verdadeira aprendizagem. Só aprende quem se prende a tudo, quem se sabe em comunhão com o universo. Só aprende quem descobre a vida compassiva, quer dizer, quem se sabe ser de partilha.
O Leandro suicidou-se por causa da escola. Foi vítima de bullying e este fenómeno é inerente à escola, não há que deturpar o seu sentido escolar. E esta não é a escola que queremos para os nossos filhos, nem a sociedade que queremos para todos nós. Por este motivo a atitude da direcção da escola do Leandro (a escola era do Leandro, como é de todos nós) não é só execrável: é um espelho da sociedade em que vivemos, uma sociedade discriminatória, cada vez mais desigual. Não restem dúvidas: se o Leandro fosse filho dum senhor juiz ou dum médico, dum engenheiro, dum professor, neste momento não estariam à procura dum cadáver nas margens do rio Tua.
Já estive em conselhos de turma em que se perguntava: ‘O João é filho de quem?’; ‘Sabem quem são os filhos de professores?’; ‘Olhem que o pai da Joana é professor catedrático!’. Os filhos dos ‘outros’ ficam na penumbra. Isto em muitos casos pesa. Os filhos de pais que não têm estatuto social muito dificilmente chegam a medicina. Pode até haver muitas excepções, mas isso não me fará abandonar esta convicção.
E se os alunos forem portadores duma deficiência desafiante (que exija muito trabalho), então a coisa pode tornar-se tétrica. Não em todas as escolas, porque há escolas muito preocupadas com estas situações. Esta situação fica a dever-se à falta de formação dos professores (que, no caso das necessidades educativas especiais é praticamente nula – há professores a trabalhar no ensino especial sem qualquer qualificação académica na área); à sobrecarga dos horários de muitos professores – se tiverem cento e muitos alunos, não conseguem prestar atenção a cada um, o que se torna mais problemático no caso dos alunos com uma grande necessidade de investimento pedagógico; mas também há quem não queria os alunos portadores de deficiência na escola dita ‘normal’ – o que contraria o ideal da escola inclusiva que é um dos sustentáculos da sociedade democrática.
O mutismo da direcção da escola de Mirandela (e de todos nós) provará que o bullying é inerente à escola, à forma como a escola está estruturada – se a escola estivesse mesmo entregue à comunidade local, a quem o seu director deveria prestar contas?
Nos últimos anos o quadro legal que suporta a gestão escolar sofreu mudanças que comprometeram o funcionamento democrático das escolas e promoveram o autoritarismo e o autismo administrativo. Hoje nada é verdadeiramente discutido dentro das escolas. Mesmo um órgão tão importante como o conselho pedagógico está completamente manietado, porque a nomeação dos seus membros depende do director.
Os Leandros não se conseguem fazer ouvir; os pais dos Leandros são tratados com sobranceria por quem se julga cultural e socialmente melhor do que eles. Só os agressores se sentem à vontade na escola. Esses vêem-se protegidos por um muro de silêncio e de indiferença.
E nós continuamos cegos, surdos e mudos. A bem da pasmaceira social. Até quando?
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Manifesto
2010 é o ano em que passa um século sobre a implantação da República em Portugal e no início de 2011 realizar-se-ão eleições presidenciais. Independentemente da questão do regime, 2010 impõe-se como um marco fundamental para lançar uma reflexão pública sobre o país e o mundo que temos e queremos. Reflexão tanto mais urgente quanto há sinais cada vez mais evidentes do crescente divórcio entre o Estado e a sociedade, traduzido em eleições onde a abstenção triunfa sistematicamente, fruto do descrédito galopante da classe política, da própria política e do deserto de ideias em que vivemos, mas também do comodismo e indiferentismo dos portugueses, que muito criticam, mas dificilmente buscam conceber alternativas e pô-las em prática.
Aqui se apresenta a proposta de um cidadão português que, no decurso da sua docência universitária, obra publicada e intervenção cultural, tem seguido com interesse e preocupação os rumos recentes de Portugal e do mundo. Convicto de que urge refundar Portugal, eis uma lista de prioridades para o país e o mundo melhor a que temos direito e que todos temos o dever de construir. Agradecem-se os contributos críticos, de modo a que a proposta se aperfeiçoe e complete e sirva de plataforma para a discussão pública e a intervenção cultural e cívica que visa, pelos meios que se verificarem ser os mais oportunos.
I – Portugal é uma nação que, pela diáspora planetária da sua história e cultura, pela situação geográfica e pela língua, com 240 milhões de falantes em toda a comunidade lusófona, tem a potencialidade de ser uma nação cosmopolita, uma nação de todo o mundo, que estabeleça pontes, mediações e diálogos entre todos os povos, culturas e civilizações. Este perfil vocaciona-nos para o cultivo dos valores mais universalistas, promovendo o diálogo com todas as culturas mundiais. Os valores mais universalistas são aqueles que promovam o melhor possível para todos, uma cultura da paz, da compreensão e da fraternidade à escala planetária, visando não apenas o bem da espécie humana, mas também a preservação da natureza e do bem-estar de todas as formas de vida animal, como condição da própria qualidade e dignidade da vida humana.
II – O nosso potencial universalista tem sido sistematicamente ignorado pelas nossas orientações governativas, desde a época dos Descobrimentos até hoje. Se no passado predominou a pretensão de dilatar a Fé e o Império, hoje predomina a sujeição da nação aos novos senhores do mundo, as grandes esferas de interesses político-económicos. Portugal está ao serviço da globalização de um paradigma de desenvolvimento económico-tecnológico que explora desenfreadamente os recursos naturais e instrumentaliza homens e animais, donde resulta um enorme sofrimento, um fosso crescente entre homens, classes, povos e nações, a redução da biodiversidade e o arrastar do planeta para uma crise sem precedentes.
III – A assunção do nosso potencial universalista implica uma reforma das mentalidades, com plena expressão ética, cultural, social, política e económica. Nesse sentido se propõem as seguintes medidas urgentes, que visam implementar entre nós um novo paradigma, convergente com as melhores aspirações humanas e com os grandes desafios deste início do século XXI:
1 – Portugal deve dar prioridade absoluta a um desenvolvimento económico sustentado, que salvaguarde a harmonia ecológica e o bem-estar da população humana e animal. A Constituição da República Portuguesa deve consagrar a senciência dos animais – a sua capacidade de sentir dor e prazer - e o seu direito à vida e ao bem-estar. Portugal deve aprender com a legislação das nações europeias mais evoluídas neste domínio, adaptando-a à realidade nacional.
2 – Portugal deve ensaiar modelos de desenvolvimento alternativos, que preservem e promovam a diversidade cultural, biológica e ecoregional. Há que promover a sustentabilidade económica do país, desenvolvendo as economias locais. Devem-se substituir quanto possível as energias não-renováveis (petróleo, carvão, gás natural, energia nuclear), por energias renováveis e alternativas (solar, eólica, hidráulica, marmotriz, etc.), superando o paradigma, a vulnerabilidade e as dependências de uma economia baseada no petróleo e nos hidrocarbonetos. Deve-se particularmente explorar as potencialidades energéticas dos nossos mais de 900 km de costa.
3 - Devem-se ensaiar formas de organização económica cujo objectivo fundamental não seja apenas o lucro financeiro. Deve-se assegurar o predomínio da ética e da política sobre a economia, de modo a que a produção e distribuição da riqueza vise o bem comum do ecossistema e dos seres vivos, a satisfação das necessidades básicas dos homens e a melhoria geral da sua qualidade de vida, bem como o acesso de todos à educação e à cultura.
4 - Deve-se investir num programa pedagógico de redução das necessidades artificiais que permita oferecer alternativas ao produtivismo e consumismo, fazendo do trabalho e do desenvolvimento económico não um fim em si, com o inevitável dano da harmonia ecológica, da biodiversidade e do bem-estar de homens e animais, mas um mero meio para a fruição de um crescente tempo livre de modo mais gratificante e criativo. Deve-se fiscalizar mais rigorosamente o crédito ao consumo, de forma a evitar o crescente endividamento das famílias.
5 – Há que criar um serviço público de saúde eficiente e acessível a todos, que inclua a possibilidade de optar por medicinas e terapias alternativas, de qualidade e eficácia comprovada, como a homeopatia, a acupunctura, a osteopatia, o shiatsu, o yoga, a meditação, etc. Estas opções, bem como os medicamentos naturais e alternativos, devem ser igualmente comparticipadas pelo Estado.
6 – Importa informar e sensibilizar a população para os efeitos nocivos de vários hábitos alimentares - nomeadamente o consumo excessivo de carne - , para o meio ambiente, a saúde pública e o bem-estar de homens e animais. Sendo uma das principais causas do aquecimento global, do esgotamento dos recursos naturais e do sofrimento dos animais, há que restringir e criar alternativas à agropecuária intensiva. Deve-se divulgar a possibilidade de se viver saudavelmente com uma alimentação não-carnívora, vegetariana ou vegan e devem-se reduzir os impostos sobre os produtos de origem natural e biológica.
7 - Portugal, a par do desenvolvimento económico sustentado, deve investir sobretudo nos domínios da saúde, da educação e da cultura, não só tecnológica, mas filosófica, literária, artística e científica. O Orçamento do Estado deve reflectir isso, reduzindo os gastos com a Defesa, o Exército e as obras públicas de fachada. Urge moralizar e reduzir os salários e reformas de presidentes, ministros, deputados e detentores de cargos na administração pública e privada, a par do aumento dos impostos sobre os grandes rendimentos.
8 - Redignificar, com exigência, os professores e todos os profissionais ligados à educação e à cultura. A educação e a cultura não devem estar dependentes de critérios economicistas e das flutuações do mercado de emprego. Os vários níveis de ensino visarão a formação integral da pessoa, não a sacrificando a uma mera funcionalização profissional. A par disto, há que sensibilizar as famílias para não abandonarem as crianças em frente dos computadores e dos maus programas de televisão. A televisão pública deve melhorar o seu nível, investindo mais em programas de informação e formação.
Nos vários níveis de ensino deve ser introduzida uma disciplina que sensibilize para o respeito pela natureza, a vida humana e a vida animal, bem como outra que informe sobre a diversidade de paradigmas culturais, morais e religiosos coexistentes nas sociedades contemporâneas. Nos mesmos níveis de ensino deve estar presente a cultura portuguesa e lusófona, bem como as várias culturas planetárias. Um português culto e bem formado deve ter uma consciência lusófona e universal, não apenas europeia-ocidental.
A meditação, com benefícios científicamente reconhecidos - quanto ao equilíbrio e saúde psicofisiológicos, ao aumento da concentração e da memória, à melhoria na aprendizagem, à maior eficiência no trabalho e à harmonia nas relações humanas - , deve ser facultada em todos os níveis dos currículos escolares, em termos puramente laicos, sem qualquer componente religiosa.
9 - Portugal deve assumir-se na primeira linha da defesa dos direitos humanos e dos seres vivos em todos os pontos do planeta em que sejam violados, sem obedecer a pressões políticas ou económicas internacionais. Portugal deve ser um lugar de bom acolhimento para todos os emigrantes e estrangeiros que o procurem para trabalhar e viver.
10 – Portugal deve aprofundar as relações culturais, económicas e políticas com as nações de língua portuguesa, incluindo a região da Galiza, Goa, Damão, Diu, Macau e os outros lugares da nossa diáspora onde se fala o português, sensibilizando a comunidade lusófona para as causas universais, ambientais, humanitárias e animais.
11 - Portugal deve promover a Lusofonia e os valores universalistas da cultura portuguesa e lusófona no mundo, dando o seu melhor exemplo e contributo para converter a sociedade planetária na possível comunidade ético-cultural e ecuménica visada entre nós por Luís de Camões, Padre António Vieira, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva. Portugal deve assumir-se como um espaço multicultural e de convivência com a diversidade, um espaço privilegiado para o tão actual desafio do diálogo intercultural e inter-religioso, alargado ao diálogo entre crentes e descrentes. Deve precaver-se contudo de tentações neo-imperialistas e de qualquer nacionalismo lusófono ou lusocêntrico. A Lusofonia não deve abafar outras línguas e culturas que existam no seu espaço.
12 - Verifica-se haver em Portugal e na Europa em geral uma grave crise de representação eleitoral, patente na elevada abstenção e descrédito dos políticos, dos partidos e da política, os quais, segundo a opinião geral, apenas promovem o acesso ao poder de indivíduos e grupos que sacrificam o bem comum a interesses pessoais e particulares, com destaque para os das grandes forças económicas. As eleições são assim sistematicamente ganhas por representantes de minorias, relativamente à totalidade dos cidadãos eleitores, que governam isolados da maioria real das populações, que os consideram com alheamento, desconfiança e desprezo, tornando-se vítimas passivas das suas políticas. O actual sistema eleitoral também não promove a melhor justiça representativa, não facilitando a representação de uma maior diversidade de forças políticas e limitando-a às organizações partidárias, o que contribui para a instrumentalização do aparelho de Estado, dos lugares de decisão político-económica e da comunicação social pelos grandes partidos.
Esta é uma situação que compromete seriamente a democracia e que a história ensina anteceder todas as tentativas de soluções ditatoriais. Há que regenerar a democracia em Portugal, reformando o estado e o sistema eleitoral segundo modelos que fomentem a mais ampla participação e intervenção política da sociedade civil, facilitando a representação de novas forças políticas e possibilitando que cidadãos independentes concorram às eleições. Deve-se recuperar a tradição municipalista portuguesa e promover uma regionalização e descentralização administrativa equilibradas, assegurando mecanismos de prevenção e controlo dos despotismos locais.
Há que colocar a política ao serviço da ética e da cultura e mobilizar a população para a intervenção cívica e política em torno dos desafios fundamentais do nosso tempo, com destaque para a protecção da natureza, o bem-estar dos seres vivos e uma nova consciência planetária. Há que mobilizar os cidadãos indiferentes e descrentes da vida política, a enorme percentagem de abstencionistas e todos aqueles que se limitam a votar, para a responsabilidade de reflectirem, discutirem e criarem o melhor destino a dar à nação. Há que, dentro dos quadros democráticos e legais, promover formas alternativas de intervenção cultural, social e cívica, que permitam antecipar tanto quanto possível a realidade desejada, sem depender dos poderes instituídos.
Convicto de que estas medidas permitirão que Portugal recupere o pioneirismo e criatividade que o caracterizou no impulso dos Descobrimentos, mas agora sem escravizar e explorar outros povos, apelo a que todos dêem o vosso contributo para a discussão, aperfeiçoamento e divulgação deste Manifesto. De todos nós depende que ele se constitua na plataforma de um movimento cívico e cultural de reflexão e acção, que nos arranque ao comodismo e passividade em que estamos instalados.
Por um Outro Portugal!
Aqui se apresenta a proposta de um cidadão português que, no decurso da sua docência universitária, obra publicada e intervenção cultural, tem seguido com interesse e preocupação os rumos recentes de Portugal e do mundo. Convicto de que urge refundar Portugal, eis uma lista de prioridades para o país e o mundo melhor a que temos direito e que todos temos o dever de construir. Agradecem-se os contributos críticos, de modo a que a proposta se aperfeiçoe e complete e sirva de plataforma para a discussão pública e a intervenção cultural e cívica que visa, pelos meios que se verificarem ser os mais oportunos.
I – Portugal é uma nação que, pela diáspora planetária da sua história e cultura, pela situação geográfica e pela língua, com 240 milhões de falantes em toda a comunidade lusófona, tem a potencialidade de ser uma nação cosmopolita, uma nação de todo o mundo, que estabeleça pontes, mediações e diálogos entre todos os povos, culturas e civilizações. Este perfil vocaciona-nos para o cultivo dos valores mais universalistas, promovendo o diálogo com todas as culturas mundiais. Os valores mais universalistas são aqueles que promovam o melhor possível para todos, uma cultura da paz, da compreensão e da fraternidade à escala planetária, visando não apenas o bem da espécie humana, mas também a preservação da natureza e do bem-estar de todas as formas de vida animal, como condição da própria qualidade e dignidade da vida humana.
II – O nosso potencial universalista tem sido sistematicamente ignorado pelas nossas orientações governativas, desde a época dos Descobrimentos até hoje. Se no passado predominou a pretensão de dilatar a Fé e o Império, hoje predomina a sujeição da nação aos novos senhores do mundo, as grandes esferas de interesses político-económicos. Portugal está ao serviço da globalização de um paradigma de desenvolvimento económico-tecnológico que explora desenfreadamente os recursos naturais e instrumentaliza homens e animais, donde resulta um enorme sofrimento, um fosso crescente entre homens, classes, povos e nações, a redução da biodiversidade e o arrastar do planeta para uma crise sem precedentes.
III – A assunção do nosso potencial universalista implica uma reforma das mentalidades, com plena expressão ética, cultural, social, política e económica. Nesse sentido se propõem as seguintes medidas urgentes, que visam implementar entre nós um novo paradigma, convergente com as melhores aspirações humanas e com os grandes desafios deste início do século XXI:
1 – Portugal deve dar prioridade absoluta a um desenvolvimento económico sustentado, que salvaguarde a harmonia ecológica e o bem-estar da população humana e animal. A Constituição da República Portuguesa deve consagrar a senciência dos animais – a sua capacidade de sentir dor e prazer - e o seu direito à vida e ao bem-estar. Portugal deve aprender com a legislação das nações europeias mais evoluídas neste domínio, adaptando-a à realidade nacional.
2 – Portugal deve ensaiar modelos de desenvolvimento alternativos, que preservem e promovam a diversidade cultural, biológica e ecoregional. Há que promover a sustentabilidade económica do país, desenvolvendo as economias locais. Devem-se substituir quanto possível as energias não-renováveis (petróleo, carvão, gás natural, energia nuclear), por energias renováveis e alternativas (solar, eólica, hidráulica, marmotriz, etc.), superando o paradigma, a vulnerabilidade e as dependências de uma economia baseada no petróleo e nos hidrocarbonetos. Deve-se particularmente explorar as potencialidades energéticas dos nossos mais de 900 km de costa.
3 - Devem-se ensaiar formas de organização económica cujo objectivo fundamental não seja apenas o lucro financeiro. Deve-se assegurar o predomínio da ética e da política sobre a economia, de modo a que a produção e distribuição da riqueza vise o bem comum do ecossistema e dos seres vivos, a satisfação das necessidades básicas dos homens e a melhoria geral da sua qualidade de vida, bem como o acesso de todos à educação e à cultura.
4 - Deve-se investir num programa pedagógico de redução das necessidades artificiais que permita oferecer alternativas ao produtivismo e consumismo, fazendo do trabalho e do desenvolvimento económico não um fim em si, com o inevitável dano da harmonia ecológica, da biodiversidade e do bem-estar de homens e animais, mas um mero meio para a fruição de um crescente tempo livre de modo mais gratificante e criativo. Deve-se fiscalizar mais rigorosamente o crédito ao consumo, de forma a evitar o crescente endividamento das famílias.
5 – Há que criar um serviço público de saúde eficiente e acessível a todos, que inclua a possibilidade de optar por medicinas e terapias alternativas, de qualidade e eficácia comprovada, como a homeopatia, a acupunctura, a osteopatia, o shiatsu, o yoga, a meditação, etc. Estas opções, bem como os medicamentos naturais e alternativos, devem ser igualmente comparticipadas pelo Estado.
6 – Importa informar e sensibilizar a população para os efeitos nocivos de vários hábitos alimentares - nomeadamente o consumo excessivo de carne - , para o meio ambiente, a saúde pública e o bem-estar de homens e animais. Sendo uma das principais causas do aquecimento global, do esgotamento dos recursos naturais e do sofrimento dos animais, há que restringir e criar alternativas à agropecuária intensiva. Deve-se divulgar a possibilidade de se viver saudavelmente com uma alimentação não-carnívora, vegetariana ou vegan e devem-se reduzir os impostos sobre os produtos de origem natural e biológica.
7 - Portugal, a par do desenvolvimento económico sustentado, deve investir sobretudo nos domínios da saúde, da educação e da cultura, não só tecnológica, mas filosófica, literária, artística e científica. O Orçamento do Estado deve reflectir isso, reduzindo os gastos com a Defesa, o Exército e as obras públicas de fachada. Urge moralizar e reduzir os salários e reformas de presidentes, ministros, deputados e detentores de cargos na administração pública e privada, a par do aumento dos impostos sobre os grandes rendimentos.
8 - Redignificar, com exigência, os professores e todos os profissionais ligados à educação e à cultura. A educação e a cultura não devem estar dependentes de critérios economicistas e das flutuações do mercado de emprego. Os vários níveis de ensino visarão a formação integral da pessoa, não a sacrificando a uma mera funcionalização profissional. A par disto, há que sensibilizar as famílias para não abandonarem as crianças em frente dos computadores e dos maus programas de televisão. A televisão pública deve melhorar o seu nível, investindo mais em programas de informação e formação.
Nos vários níveis de ensino deve ser introduzida uma disciplina que sensibilize para o respeito pela natureza, a vida humana e a vida animal, bem como outra que informe sobre a diversidade de paradigmas culturais, morais e religiosos coexistentes nas sociedades contemporâneas. Nos mesmos níveis de ensino deve estar presente a cultura portuguesa e lusófona, bem como as várias culturas planetárias. Um português culto e bem formado deve ter uma consciência lusófona e universal, não apenas europeia-ocidental.
A meditação, com benefícios científicamente reconhecidos - quanto ao equilíbrio e saúde psicofisiológicos, ao aumento da concentração e da memória, à melhoria na aprendizagem, à maior eficiência no trabalho e à harmonia nas relações humanas - , deve ser facultada em todos os níveis dos currículos escolares, em termos puramente laicos, sem qualquer componente religiosa.
9 - Portugal deve assumir-se na primeira linha da defesa dos direitos humanos e dos seres vivos em todos os pontos do planeta em que sejam violados, sem obedecer a pressões políticas ou económicas internacionais. Portugal deve ser um lugar de bom acolhimento para todos os emigrantes e estrangeiros que o procurem para trabalhar e viver.
10 – Portugal deve aprofundar as relações culturais, económicas e políticas com as nações de língua portuguesa, incluindo a região da Galiza, Goa, Damão, Diu, Macau e os outros lugares da nossa diáspora onde se fala o português, sensibilizando a comunidade lusófona para as causas universais, ambientais, humanitárias e animais.
11 - Portugal deve promover a Lusofonia e os valores universalistas da cultura portuguesa e lusófona no mundo, dando o seu melhor exemplo e contributo para converter a sociedade planetária na possível comunidade ético-cultural e ecuménica visada entre nós por Luís de Camões, Padre António Vieira, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva. Portugal deve assumir-se como um espaço multicultural e de convivência com a diversidade, um espaço privilegiado para o tão actual desafio do diálogo intercultural e inter-religioso, alargado ao diálogo entre crentes e descrentes. Deve precaver-se contudo de tentações neo-imperialistas e de qualquer nacionalismo lusófono ou lusocêntrico. A Lusofonia não deve abafar outras línguas e culturas que existam no seu espaço.
12 - Verifica-se haver em Portugal e na Europa em geral uma grave crise de representação eleitoral, patente na elevada abstenção e descrédito dos políticos, dos partidos e da política, os quais, segundo a opinião geral, apenas promovem o acesso ao poder de indivíduos e grupos que sacrificam o bem comum a interesses pessoais e particulares, com destaque para os das grandes forças económicas. As eleições são assim sistematicamente ganhas por representantes de minorias, relativamente à totalidade dos cidadãos eleitores, que governam isolados da maioria real das populações, que os consideram com alheamento, desconfiança e desprezo, tornando-se vítimas passivas das suas políticas. O actual sistema eleitoral também não promove a melhor justiça representativa, não facilitando a representação de uma maior diversidade de forças políticas e limitando-a às organizações partidárias, o que contribui para a instrumentalização do aparelho de Estado, dos lugares de decisão político-económica e da comunicação social pelos grandes partidos.
Esta é uma situação que compromete seriamente a democracia e que a história ensina anteceder todas as tentativas de soluções ditatoriais. Há que regenerar a democracia em Portugal, reformando o estado e o sistema eleitoral segundo modelos que fomentem a mais ampla participação e intervenção política da sociedade civil, facilitando a representação de novas forças políticas e possibilitando que cidadãos independentes concorram às eleições. Deve-se recuperar a tradição municipalista portuguesa e promover uma regionalização e descentralização administrativa equilibradas, assegurando mecanismos de prevenção e controlo dos despotismos locais.
Há que colocar a política ao serviço da ética e da cultura e mobilizar a população para a intervenção cívica e política em torno dos desafios fundamentais do nosso tempo, com destaque para a protecção da natureza, o bem-estar dos seres vivos e uma nova consciência planetária. Há que mobilizar os cidadãos indiferentes e descrentes da vida política, a enorme percentagem de abstencionistas e todos aqueles que se limitam a votar, para a responsabilidade de reflectirem, discutirem e criarem o melhor destino a dar à nação. Há que, dentro dos quadros democráticos e legais, promover formas alternativas de intervenção cultural, social e cívica, que permitam antecipar tanto quanto possível a realidade desejada, sem depender dos poderes instituídos.
Convicto de que estas medidas permitirão que Portugal recupere o pioneirismo e criatividade que o caracterizou no impulso dos Descobrimentos, mas agora sem escravizar e explorar outros povos, apelo a que todos dêem o vosso contributo para a discussão, aperfeiçoamento e divulgação deste Manifesto. De todos nós depende que ele se constitua na plataforma de um movimento cívico e cultural de reflexão e acção, que nos arranque ao comodismo e passividade em que estamos instalados.
Por um Outro Portugal!
Contribuidores
- Ana Moreira
- Ana Rodrigues
- Bernardo Almeida
- Dr Carlos Gonçalves
- Duarte D. Braga
- Duarte
- Estudo Geral
- Fernando Emídio
- Gil
- Glimpse
- Helena Caetano
- Isabel Rosete
- Isabel Santiago
- João Beato
- João Lopes Aguiar
- José Magalhães
- Luís Miguel Dantas
- Luis Resina
- Luis Resina
- MJC
- Margarida
- Maria de Lourdes Teixeira Puga Alvarez
- Maribel Sobreira
- Maurícia Teles da Silva
- Minda
- Moysés
- P.F. Antunes
- Paulo Borges
- Pedro Miguel Estrela
- Pedro Paz
- Pedro Sena
- Rui Matoso
- Rute Pinheiro
- Sérgio Mago
- aluzdascasas
- ana
- castus
- ethel
- jads
- lurdes
- maria alvarez
- paula
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