Um espaço para reinventar Portugal como nação de todo o Mundo, que estabeleça pontes, mediações e diálogos entre todos os povos, culturas e civilizações e promova os valores mais universalistas, conforme o símbolo da Esfera Armilar. Há que visar o melhor possível para todos, uma cultura da paz, da compreensão e da fraternidade à escala planetária, orientada não só para o bem da espécie humana, mas também para a preservação da natureza e o bem-estar de todas as formas de vida sencientes.

"Nós, Portugal, o poder ser"

- Fernando Pessoa, Mensagem.

Propostas do grupo Economia e Energia

I.
Portugal, pela suas características naturais, pela capacidade inovadora que ao longo da sua história tem revelado, pela excelência dos seus recursos humanos e pelo trabalho que tem vindo a iniciar nos últimos anos, apresenta todas as condições para se assumir como um dos líderes no desenvolvimento de energias renováveis, criando um nicho de desenvolvimento económico assente nos sectores com elas relacionados.
Uma aposta clara no desenvolvimento de energias alternativas (solar, eólica, marmotriz, geotérmica, magnética, etc.) às assentes em combustíveis fósseis, com uma ambição internacional, permitiria a criação de emprego especializado e altamente qualificado, a criação de riqueza, o desenvolvimento da educação e da investigação, a redução da dependência energética, uma melhoria da nossa balança de transacções com o exterior e a liderança no campo do saber. Esta aposta deverá passar pelo apoio a projectos de investigação, desenvolvimento e investimento provenientes dos diversos agentes. O apoio necessário não se esgota em questões de financiamento, mas deverá incluir também apoio técnico, de orientação e de incentivo ao empreendedorismo.
Deverão ainda ser fortemente apoiadas as iniciativas individuais ou comunitárias que contribuam para a redução do consumo energético ou para a auto-suficiência neste campo.
II.
A implantação de energias alternativas no nosso país deverá ser criteriosa. A sua utilização indiscriminada poderá ter efeitos contrários aos desejados, pelo que deverão existir regras bem definidas para a sua implementação. O recurso à energia eólica, por exemplo, deverá ter em conta os locais ambientalmente mais sensíveis, face ao impacto que os equipamentos a ela associados apresentam na paisagem, na flora e na fauna locais (alteração de corredores de migração de aves, impacto dos grandes caminhos de acesso aos parques, consequências ao nível da flora que, em alguns casos, só existe nos cimos das serras, etc.). Assim, deverá ser claramente previsto em lei a proibição da criação de campos eólicos em parques naturais e áreas protegidas, sem qualquer excepção.
A energia nuclear proveniente da “fusão a quente” deverá ser taxativamente recusada. Para além do risco de acidentes graves, mantêm-se as questões relacionadas com os resíduos. Enquanto a sua eliminação não for possível, todas as soluções encontradas serão insatisfatórias, uma vez que apenas adiam o problema, não o resolvendo.
III.
A crescente confusão entre os conceitos de desenvolvimento económico e de crescimento económico que está presente nos discursos oficiais, na comunicação social e na opinião pública em geral é um reflexo de alguns dos valores que predominam na sociedade actual.
O crescimento económico é medido a partir da produção comercializável, sendo que a sua avaliação é feita com base nos agregados da contabilidade nacional, como o Produto Interno Bruto (PIB) ou o Rendimento Nacional. Mas este indicadores pouco ou nada nos dizem sobre o desenvolvimento económico, cuja avaliação inclui as mudanças das estruturas mentais e dos hábitos sociais, a distribuição da riqueza produzida, a justiça do sistema fiscal, a qualidade da educação, a igualdade de oportunidades, etc.
No entanto, o crescimento económico tem sido, frequentemente, o único barómetro utilizado pelos responsáveis políticos – com eco na comunicação social - para medir o bem-estar e a “saúde” de um território.
De facto, quando se analisa a economia do país ou de uma das suas regiões, os indicadores que sobressaem e aos quais é dada maior relevância são indicadores que se debruçam, quase exclusivamente em critérios de crescimento económico, de criação de riqueza ou relacionados com a produtividade. Esses indicadores são centrados exclusivamente no homem e desligados do meio em que ele se insere.
Estando inseridos num ecossistema dinâmico, se por via da nossa capacidade racional não percebermos a falácia que constitui a lógica dominante subordinada ao crescimento económico a todo o custo, estaremos condenados a aprender por via de mecanismos naturais as consequências de perturbarmos em demasiado o estado de equilíbrio natural.
Assim, como instrumentos para definição de políticas económicas propomos o estudo, adopção e utilização de indicadores alternativos que sejam verdadeiros barómetros para aferir do bem-estar real das populações, numa perspectiva holística, devendo ser divulgados com a mesma importância que normalmente é atribuída aos indicadores tradicionais.
Como exemplo, propomos a adopção do FIB - Felicidade Interna Bruta. Este indicador, adoptado pelo Butão, não se encontra em contraposição ao PIB: este é parte integrante do primeiro, uma vez que o crescimento económico também promove o bem-estar. No entanto, também não pretende valorizar exclusivamente a capacidade produtiva da população. Para o seu cálculo são tidos em conta elementos como o bem-estar psicológico (sendo utilizados indicadores como níveis de stress, actividades espirituais, auto-avaliação da saúde, …), a utilização do tempo, a saúde, a educação, a diversidade cultural, a avaliação do sistema governativo, a diversidade ecológica, etc.).
IV.
Face às limitações do crescimento económico, ao esgotamento dos combustíveis fósseis, ao êxodo das populações e à necessidade de dinamização das economias locais, consideramos que o desenvolvimento rural deverá passar, em grande medida, por políticas que promovam a resiliência.
Nesse sentido, propomos o desenvolvimento e apoio a estruturas que permitam às comunidades locais e regionais ter capacidade para lidar com choques económicos e energéticos externos, mantendo as suas características intrínsecas, o que implica garantir condições de auto-suficiência.
O desenvolvimento local deverá também passar pela relocalização, dinamizando políticas e iniciativas que permitam às diversas regiões e/ou comunidades libertarem-se de uma dependência excessiva da economia global, investindo os seus próprios recursos para produzir uma parcela significativa dos bens e serviços que consomem: água, alimentação, materiais de construção, tecidos, madeira, energia, etc..
Em última análise, com a crescente indisponibilidade de combustíveis fósseis, a nossa capacidade de transportar mercadorias irá, necessariamente, diminuir, tornando o processo inevitável. Assim, devemos começar já a construir as infra-estruturas que permitam o fornecimento local.
Como política de desenvolvimento regional, consideramos importante o apoio a iniciativas que promovam a utilização de moedas locais e/ou regionais: mecanismos de troca que garantam que uma grande parte do consumo seja feito localmente, produzindo riqueza que se redistribuirá ao nível da comunidade/região e reforçando a cooperação económica e social entre os habitantes.
Defendemos que deverá ser dada particular atenção a estas iniciativas nas regiões que sofrem problemas de interioridade e que a sua gestão seja feita por organismos que agreguem todos os agentes económicos regionais.
V.
Uma rede de transportes eficiente assume uma importância vital na economia de qualquer país. Portugal não é excepção. Nas últimas décadas, o país realizou um enorme investimento na construção de uma rede viária, privilegiando o transporte rodoviário.
Apesar das vantagens que uma rede de estradas apresenta para a circulação de pessoas e bens, uma política de transportes potenciadora de bem-estar não se pode esgotar aí. É necessário actuar em áreas como a rede ferroviária nacional e o incentivo à utilização de meios colectivos e alternativos de transporte.
A ferrovia possui uma grande capacidade de transporte, apresenta uma velocidade elevada, realiza o seu tráfego em vias exclusivas e tem um custo operacional baixo em relação ao peso total transportado. Para além disso, é seguro, energeticamente eficiente e é uma alternativa válida a outros meios de transporte mais poluentes, podendo dar uma grande contribuição para a redução do número de automóveis em circulação.
Assim, Portugal deveria realizar uma aposta séria na recuperação, modernização e expansão da sua ferrovia, tornando-a um elemento fundamental da sua política de transportes e de desenvolvimento da economia local e regional.
Tem-se assistido também, nos últimos anos, à criação de uma série de infra-estruturas destinadas ao passeio pedestre e de bicicleta, muitas vezes aproveitando vias-férreas desactivadas. São iniciativas que merecem elogio e que deverão continuar a ser incentivadas.
No entanto, essas vias são normalmente localizadas em áreas periféricas aos centros urbanos. É necessário incentivar a utilização da bicicleta como meio de transporte nas cidades. Um passo fundamental para que tal aconteça é a criação de vias exclusivas para a sua circulação dentro das zonas urbanas, bem como a sua ligação às zonas rurais.
O reforço dos meios de transporte colectivos deverá ser um elemento indispensável de uma política energética e ambiental eficiente. Eles deverão estar disponíveis para todos os potenciais utilizadores, a preços acessíveis (o custo acrescido será, decerto, compensado com a poupança nos gastos de saúde) e inseridos em redes flexíveis e com horários realistas face às necessidades das populações em geral.
Neste âmbito, não nos poderemos limitar a olhar apenas para a rede urbana. É urgente repensar e desenvolver os transportes colectivos que ligam as cidades às áreas rurais, sendo esta questão ainda mais urgente no interior do país.
Por outro lado, todos os transportes colectivos, bem como as viaturas do Estado, deverão, obrigatoriamente, ser eco-eficientes.
VI.
Nos últimos anos, tem crescido de forma exponencial a oferta turística no nosso país. No entanto, os factores de atractividade que Portugal apresenta e que se propõe explorar são consecutiva e dramaticamente alterados, degradando-se a oferta inicialmente proposta. Um triste exemplo é o Algarve turístico, cuja exploração assente num turismo de massas matou a qualidade da oferta inicial, não trazendo necessariamente uma melhoria nas condições de vida das populações locais, tendo em conta os princípios do desenvolvimento sustentável e da preservação da cultura e natureza.
Entendemos que o turismo deverá ser encarado como uma consequência do desenvolvimento social, cultural e natural e não uma causa directa e primordial, nunca podendo colocar em causa a sustentabilidade dos recursos nacionais.
A promoção do turismo em Portugal deverá ser sustentada primordialmente pelo interesse regional, criando valor acrescentado baseado nas especificidades de cada região, procurando manter nas comunidades locais a riqueza por ele gerada.
VII.
O potencial universalista de Portugal, dada a diáspora planetária da sua história, cultura e língua deverá também estar presente nas relações económicas internacionais, desde que se abandonem lógicas de colonialismo, exploração e domínio.
A ligação privilegiada de Portugal aos países de língua oficial portuguesa deveria ter reflexos em relações económicas potenciadoras de benefícios mútuos assentes em valores humanos e justos.
Neste contexto, propõe-se a criação de um espaço comunitário partilhado pelos países de língua oficial portuguesa com uma circulação de bens, pessoas e conhecimento facilitada.
VIII.
Entendemos que as relações económicas externas de Portugal não poderão deixar de ter em conta violações sistemáticas de direitos humanos.
Assim, no contexto do comércio internacional, consideramos ser imprescindível a existência de uma política nacional (que envolva todos os agentes económicos e não apenas o Estado) que introduza, nas operações de importação, critérios de respeito pelos direitos humanos e pelo ambiente por países terceiros, bem como garantias de que na origem dos produtos ou serviços não estão presentes situações de exploração de mão-de-obra infantil.
IX.
Todas as mudanças profundas nos sistemas sociais, económicos e culturais só são possíveis quando acompanhadas por uma educação e formação capazes e abrangentes, que inclua o incentivo à inovação e iniciativa.
No campo económico, propomos que, desde cedo, se incluam nos currículos escolares matérias relacionadas com o empreendedorismo, de forma a educar pessoas capazes de ter iniciativa e de mobilizar recursos (incluindo os humanos) para alcançar objectivos decorrentes de uma ideia. Deverá ser disponibilizada formação aos responsáveis educativos para serem capazes de desenvolverem estas ideias segundo a perspectiva do campo de estudos de cada um.
No ensino universitário, a lógica de especialização actualmente vigente, bem como o desaparecimento dos currículos dos cursos de Economia de disciplinas como a Sociologia, a História, a Filosofia, entre outras, tem contribuído para a criação de profissionais sem uma visão holística da sociedade.
Propõe-se, assim, a adopção nos cursos universitários de Economia de disciplinas obrigatórias que permitam compreender a sociedade em que nos inserimos, a sua evolução e os diversos factores que a influenciam, fornecendo uma visão abrangente dos problemas e das possíveis soluções.

2 comentários:

Paulo Borges disse...

Excelente! Parabéns ao Carlos Ramos e a todos os membros do grupo! Trabalho sério e profundo.

Serafina disse...

Parabéns, Carlos. Boa reflexão do vosso grupo. Deixei aqui as propostas do Serge Latouche, que podem ser úteis para futuras reflexões.
Abraço,
Laura

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Propostas do grupo Economia e Energia

I.
Portugal, pela suas características naturais, pela capacidade inovadora que ao longo da sua história tem revelado, pela excelência dos seus recursos humanos e pelo trabalho que tem vindo a iniciar nos últimos anos, apresenta todas as condições para se assumir como um dos líderes no desenvolvimento de energias renováveis, criando um nicho de desenvolvimento económico assente nos sectores com elas relacionados.
Uma aposta clara no desenvolvimento de energias alternativas (solar, eólica, marmotriz, geotérmica, magnética, etc.) às assentes em combustíveis fósseis, com uma ambição internacional, permitiria a criação de emprego especializado e altamente qualificado, a criação de riqueza, o desenvolvimento da educação e da investigação, a redução da dependência energética, uma melhoria da nossa balança de transacções com o exterior e a liderança no campo do saber. Esta aposta deverá passar pelo apoio a projectos de investigação, desenvolvimento e investimento provenientes dos diversos agentes. O apoio necessário não se esgota em questões de financiamento, mas deverá incluir também apoio técnico, de orientação e de incentivo ao empreendedorismo.
Deverão ainda ser fortemente apoiadas as iniciativas individuais ou comunitárias que contribuam para a redução do consumo energético ou para a auto-suficiência neste campo.
II.
A implantação de energias alternativas no nosso país deverá ser criteriosa. A sua utilização indiscriminada poderá ter efeitos contrários aos desejados, pelo que deverão existir regras bem definidas para a sua implementação. O recurso à energia eólica, por exemplo, deverá ter em conta os locais ambientalmente mais sensíveis, face ao impacto que os equipamentos a ela associados apresentam na paisagem, na flora e na fauna locais (alteração de corredores de migração de aves, impacto dos grandes caminhos de acesso aos parques, consequências ao nível da flora que, em alguns casos, só existe nos cimos das serras, etc.). Assim, deverá ser claramente previsto em lei a proibição da criação de campos eólicos em parques naturais e áreas protegidas, sem qualquer excepção.
A energia nuclear proveniente da “fusão a quente” deverá ser taxativamente recusada. Para além do risco de acidentes graves, mantêm-se as questões relacionadas com os resíduos. Enquanto a sua eliminação não for possível, todas as soluções encontradas serão insatisfatórias, uma vez que apenas adiam o problema, não o resolvendo.
III.
A crescente confusão entre os conceitos de desenvolvimento económico e de crescimento económico que está presente nos discursos oficiais, na comunicação social e na opinião pública em geral é um reflexo de alguns dos valores que predominam na sociedade actual.
O crescimento económico é medido a partir da produção comercializável, sendo que a sua avaliação é feita com base nos agregados da contabilidade nacional, como o Produto Interno Bruto (PIB) ou o Rendimento Nacional. Mas este indicadores pouco ou nada nos dizem sobre o desenvolvimento económico, cuja avaliação inclui as mudanças das estruturas mentais e dos hábitos sociais, a distribuição da riqueza produzida, a justiça do sistema fiscal, a qualidade da educação, a igualdade de oportunidades, etc.
No entanto, o crescimento económico tem sido, frequentemente, o único barómetro utilizado pelos responsáveis políticos – com eco na comunicação social - para medir o bem-estar e a “saúde” de um território.
De facto, quando se analisa a economia do país ou de uma das suas regiões, os indicadores que sobressaem e aos quais é dada maior relevância são indicadores que se debruçam, quase exclusivamente em critérios de crescimento económico, de criação de riqueza ou relacionados com a produtividade. Esses indicadores são centrados exclusivamente no homem e desligados do meio em que ele se insere.
Estando inseridos num ecossistema dinâmico, se por via da nossa capacidade racional não percebermos a falácia que constitui a lógica dominante subordinada ao crescimento económico a todo o custo, estaremos condenados a aprender por via de mecanismos naturais as consequências de perturbarmos em demasiado o estado de equilíbrio natural.
Assim, como instrumentos para definição de políticas económicas propomos o estudo, adopção e utilização de indicadores alternativos que sejam verdadeiros barómetros para aferir do bem-estar real das populações, numa perspectiva holística, devendo ser divulgados com a mesma importância que normalmente é atribuída aos indicadores tradicionais.
Como exemplo, propomos a adopção do FIB - Felicidade Interna Bruta. Este indicador, adoptado pelo Butão, não se encontra em contraposição ao PIB: este é parte integrante do primeiro, uma vez que o crescimento económico também promove o bem-estar. No entanto, também não pretende valorizar exclusivamente a capacidade produtiva da população. Para o seu cálculo são tidos em conta elementos como o bem-estar psicológico (sendo utilizados indicadores como níveis de stress, actividades espirituais, auto-avaliação da saúde, …), a utilização do tempo, a saúde, a educação, a diversidade cultural, a avaliação do sistema governativo, a diversidade ecológica, etc.).
IV.
Face às limitações do crescimento económico, ao esgotamento dos combustíveis fósseis, ao êxodo das populações e à necessidade de dinamização das economias locais, consideramos que o desenvolvimento rural deverá passar, em grande medida, por políticas que promovam a resiliência.
Nesse sentido, propomos o desenvolvimento e apoio a estruturas que permitam às comunidades locais e regionais ter capacidade para lidar com choques económicos e energéticos externos, mantendo as suas características intrínsecas, o que implica garantir condições de auto-suficiência.
O desenvolvimento local deverá também passar pela relocalização, dinamizando políticas e iniciativas que permitam às diversas regiões e/ou comunidades libertarem-se de uma dependência excessiva da economia global, investindo os seus próprios recursos para produzir uma parcela significativa dos bens e serviços que consomem: água, alimentação, materiais de construção, tecidos, madeira, energia, etc..
Em última análise, com a crescente indisponibilidade de combustíveis fósseis, a nossa capacidade de transportar mercadorias irá, necessariamente, diminuir, tornando o processo inevitável. Assim, devemos começar já a construir as infra-estruturas que permitam o fornecimento local.
Como política de desenvolvimento regional, consideramos importante o apoio a iniciativas que promovam a utilização de moedas locais e/ou regionais: mecanismos de troca que garantam que uma grande parte do consumo seja feito localmente, produzindo riqueza que se redistribuirá ao nível da comunidade/região e reforçando a cooperação económica e social entre os habitantes.
Defendemos que deverá ser dada particular atenção a estas iniciativas nas regiões que sofrem problemas de interioridade e que a sua gestão seja feita por organismos que agreguem todos os agentes económicos regionais.
V.
Uma rede de transportes eficiente assume uma importância vital na economia de qualquer país. Portugal não é excepção. Nas últimas décadas, o país realizou um enorme investimento na construção de uma rede viária, privilegiando o transporte rodoviário.
Apesar das vantagens que uma rede de estradas apresenta para a circulação de pessoas e bens, uma política de transportes potenciadora de bem-estar não se pode esgotar aí. É necessário actuar em áreas como a rede ferroviária nacional e o incentivo à utilização de meios colectivos e alternativos de transporte.
A ferrovia possui uma grande capacidade de transporte, apresenta uma velocidade elevada, realiza o seu tráfego em vias exclusivas e tem um custo operacional baixo em relação ao peso total transportado. Para além disso, é seguro, energeticamente eficiente e é uma alternativa válida a outros meios de transporte mais poluentes, podendo dar uma grande contribuição para a redução do número de automóveis em circulação.
Assim, Portugal deveria realizar uma aposta séria na recuperação, modernização e expansão da sua ferrovia, tornando-a um elemento fundamental da sua política de transportes e de desenvolvimento da economia local e regional.
Tem-se assistido também, nos últimos anos, à criação de uma série de infra-estruturas destinadas ao passeio pedestre e de bicicleta, muitas vezes aproveitando vias-férreas desactivadas. São iniciativas que merecem elogio e que deverão continuar a ser incentivadas.
No entanto, essas vias são normalmente localizadas em áreas periféricas aos centros urbanos. É necessário incentivar a utilização da bicicleta como meio de transporte nas cidades. Um passo fundamental para que tal aconteça é a criação de vias exclusivas para a sua circulação dentro das zonas urbanas, bem como a sua ligação às zonas rurais.
O reforço dos meios de transporte colectivos deverá ser um elemento indispensável de uma política energética e ambiental eficiente. Eles deverão estar disponíveis para todos os potenciais utilizadores, a preços acessíveis (o custo acrescido será, decerto, compensado com a poupança nos gastos de saúde) e inseridos em redes flexíveis e com horários realistas face às necessidades das populações em geral.
Neste âmbito, não nos poderemos limitar a olhar apenas para a rede urbana. É urgente repensar e desenvolver os transportes colectivos que ligam as cidades às áreas rurais, sendo esta questão ainda mais urgente no interior do país.
Por outro lado, todos os transportes colectivos, bem como as viaturas do Estado, deverão, obrigatoriamente, ser eco-eficientes.
VI.
Nos últimos anos, tem crescido de forma exponencial a oferta turística no nosso país. No entanto, os factores de atractividade que Portugal apresenta e que se propõe explorar são consecutiva e dramaticamente alterados, degradando-se a oferta inicialmente proposta. Um triste exemplo é o Algarve turístico, cuja exploração assente num turismo de massas matou a qualidade da oferta inicial, não trazendo necessariamente uma melhoria nas condições de vida das populações locais, tendo em conta os princípios do desenvolvimento sustentável e da preservação da cultura e natureza.
Entendemos que o turismo deverá ser encarado como uma consequência do desenvolvimento social, cultural e natural e não uma causa directa e primordial, nunca podendo colocar em causa a sustentabilidade dos recursos nacionais.
A promoção do turismo em Portugal deverá ser sustentada primordialmente pelo interesse regional, criando valor acrescentado baseado nas especificidades de cada região, procurando manter nas comunidades locais a riqueza por ele gerada.
VII.
O potencial universalista de Portugal, dada a diáspora planetária da sua história, cultura e língua deverá também estar presente nas relações económicas internacionais, desde que se abandonem lógicas de colonialismo, exploração e domínio.
A ligação privilegiada de Portugal aos países de língua oficial portuguesa deveria ter reflexos em relações económicas potenciadoras de benefícios mútuos assentes em valores humanos e justos.
Neste contexto, propõe-se a criação de um espaço comunitário partilhado pelos países de língua oficial portuguesa com uma circulação de bens, pessoas e conhecimento facilitada.
VIII.
Entendemos que as relações económicas externas de Portugal não poderão deixar de ter em conta violações sistemáticas de direitos humanos.
Assim, no contexto do comércio internacional, consideramos ser imprescindível a existência de uma política nacional (que envolva todos os agentes económicos e não apenas o Estado) que introduza, nas operações de importação, critérios de respeito pelos direitos humanos e pelo ambiente por países terceiros, bem como garantias de que na origem dos produtos ou serviços não estão presentes situações de exploração de mão-de-obra infantil.
IX.
Todas as mudanças profundas nos sistemas sociais, económicos e culturais só são possíveis quando acompanhadas por uma educação e formação capazes e abrangentes, que inclua o incentivo à inovação e iniciativa.
No campo económico, propomos que, desde cedo, se incluam nos currículos escolares matérias relacionadas com o empreendedorismo, de forma a educar pessoas capazes de ter iniciativa e de mobilizar recursos (incluindo os humanos) para alcançar objectivos decorrentes de uma ideia. Deverá ser disponibilizada formação aos responsáveis educativos para serem capazes de desenvolverem estas ideias segundo a perspectiva do campo de estudos de cada um.
No ensino universitário, a lógica de especialização actualmente vigente, bem como o desaparecimento dos currículos dos cursos de Economia de disciplinas como a Sociologia, a História, a Filosofia, entre outras, tem contribuído para a criação de profissionais sem uma visão holística da sociedade.
Propõe-se, assim, a adopção nos cursos universitários de Economia de disciplinas obrigatórias que permitam compreender a sociedade em que nos inserimos, a sua evolução e os diversos factores que a influenciam, fornecendo uma visão abrangente dos problemas e das possíveis soluções.

2 comentários:

Paulo Borges disse...

Excelente! Parabéns ao Carlos Ramos e a todos os membros do grupo! Trabalho sério e profundo.

Serafina disse...

Parabéns, Carlos. Boa reflexão do vosso grupo. Deixei aqui as propostas do Serge Latouche, que podem ser úteis para futuras reflexões.
Abraço,
Laura

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