1. A milenar tradição contemplativa e meditativa (transversal às diferentes religiões e espiritualidades, também laicas) e os progressos contemporâneos da microfísica e das neurociências (que hoje se aproximam numa convergência histórica, como nas experiências realizadas no MIT, em Massachusetts, e nos encontros anuais Mind and Life) parecem indicar não ser possível encontrar, quer na constituição da chamada matéria, quer na da chamada mente, ou seja, nisso cujo conjunto designamos por realidade, uma mínima entidade que exista em si e por si e que permaneça idêntica a si mesma, ou seja, que tenha características próprias. Todas as dimensões da chamada realidade parecem obedecer assim a duas leis fundamentais, a de interdependência e a de impermanência, que se resumem na sua ausência de características ou qualidades intrínsecas. Como se pode constatar na mínima experiência perceptiva e como a observação científica confirma, sujeito e objecto constituem-se mutuamente e interagem num dinamismo e numa metamorfose constantes, como meros fenómenos recíprocos, sem essência própria. O conceito de identidade parece ser assim uma abstracção desadequada para expressar o real, sem outro fundamento senão o de ser uma ficção convencional e funcional, que serve o reproduzir de uma tradição fortemente entranhada nos hábitos culturais, psicológicos e sociais do senso comum humano.
2. O conceito de identidade nasce, como o seu correlato, o de alteridade, de uma experiência ingénua e irreflectida, na qual, devido a tendências e hábitos inconscientes, o sujeito se crê distinto do objecto, o eu do não-eu, o mesmo do outro, o idêntico do diferente, ao mesmo tempo que esses termos da experiência se crêem reais e existentes em si e por si, com características e qualidades próprias, positivas, negativas ou neutras, que nunca são mais do que projecção da percepção inconscientemente condicionada. Este estado, que se pode chamar de ignorância dualista, origina três tendências da experiência mental-emocional na relação sujeito-objecto: 1 – o fascínio e o desejo-apego, caso o objecto seja percepcionado como atraente e positivo; 2 – o medo e a aversão, caso o objecto seja percepcionado como repulsivo e negativo; 3 – a indiferença, caso o objecto seja percepcionado como neutro. Qualquer destas experiências resulta em conflito e sofrimento, primeiro interno e depois externo, indissociável de uma extrema vulnerabilidade perante todas as vicissitudes da vida, pois a mente dominada pelo apego e pela aversão não pode assegurar de modo algum a posse do que deseja nem a exclusão do que rejeita, devido à lei da impermanência e metamorfose constantes de tudo, sujeitando-se assim constantemente à carência do que deseja ou ao medo de o perder, bem como à ameaça do que rejeita ou ao medo de o não evitar. Por outro lado, a indiferença é uma falsa alternativa, que apenas gera a experiência de solidão, de entorpecimento mental e despotenciamento vital.
Da ignorância dualista e da combinação das três tendências referidas resultam as pulsões emocionais inerentes a todos os actos e omissões, mentais, verbais e físicos, que as tradições ético-espirituais, teístas ou não-teístas, religiosas ou laicas, designam como actos negativos, faltas, pecados ou toxinas mentais, como hoje alguns preferem: desejo possessivo, ódio e cólera, inveja e ciúme, orgulho e arrogância, avidez e avareza, torpor mental e tristeza, entre muitas outras. Em qualquer dos casos, antes de lesarem os outros, estas pulsões lesam a mente do próprio sujeito a partir do primeiro instante em que nela surgem, distorcendo a percepção da realidade, gerando ignorância, insensibilidade e tormento interior e desarmonizando a circulação da energia vital, o que tem também efeitos somáticos e predispõe o organismo para todo o tipo de doenças. Por isso são objectivamente negativas, independentemente de qualquer doutrina moral ou revelação religiosa.
3. Um olhar desapaixonado e realista sobre o processo e a história da civilização humana, desde os seus primórdios até hoje, não pode deixar de constatar que tudo – a organização social, a ciência, a técnica, a política, a economia, a cultura, a educação e a religião - tem sido predominantemente movido pela ignorância dualista, o apego, a aversão e a indiferença, bem como por todas as suas combinações possíveis, com o resultado evidente, em termos gerais, de a humanidade até hoje sempre ter obtido precisamente o que mais rejeita, o sofrimento, e sempre haver falhado aquilo a que mais aspira, a felicidade: prova evidente de que o desejo-apego e a aversão resultam precisamente no contrário do que buscam. As únicas excepções a esta monumental ilusão e a este grandioso fracasso histórico colectivo, habitualmente camuflado com os nomes de “progresso”, “evolução”, “desenvolvimento”, etc., são os seres que despertam e se libertam da ignorância dualista e das suas consequências mentais e emocionais: aqueles que as várias tradições designam como sábios, santos, etc., e que são considerados mestres espirituais quando à libertação individual acrescentam o amor e a compaixão de continuarem a agir, interior e exteriormente, para o bem e a libertação dos outros.
4. Aplicada à questão das sociedades, das culturas, das nações e das pátrias, esta visão constata que nenhuma delas existe em si e por si, com uma identidade e características permanentes e irredutivelmente próprias. Todas, pelo contrário, apesar de apresentarem complexas singularidades em devir, nascem, vivem e morrem ou metamorfoseiam-se de acordo com as leis fundamentais de interdependência e impermanência que abrangem todas as dimensões do real. Com efeito, quem pode, por exemplo, pensar o que é Portugal separando a sua história e cultura das de todos (ou quase) os povos europeus, africanos, sul-americanos e orientais, sem rejeitar que no plano da língua e da mesma história e cultura existem afinidades mais imediatas com as nações lusófonas? O conceito de identidade nacional é pois, tal como o de identidade pessoal - sobretudo se pensado de forma essencialista ou substancialista, como algo que em si e por si pré-exista ou exista fora de um devir interdependente com todas as formas de alteridade - , uma mera abstracção que em última instância apenas funciona na lógica da ignorância dualista que predomina na mente humana.
5. Tal como acontece quando se extrema a bipolarização eu-outro, o extremar da suposta identidade cultural ou nacional como uma essência única, permanente e independente das demais, conduz as mentes ao nacionalismo ou ao patriotismo ensimesmado que potenciam essa ignorância dualista e esses complexos de apego ao que parece ser próprio e de indiferença ou aversão ao que parece ser alheio, o que já vimos serem as causas fundamentais de insensibilidade, sofrimento e conflito para quem por elas se deixa dominar e para quem lhe sofre as acções daí decorrentes. O nacionalismo ou patriotismo comum, levando a amar a sua cultura, nação ou pátria acima das demais, é pois injustificável e condenável em termos espirituais, sapienciais e éticos, sendo incompatível com qualquer projecto de emancipação da consciência e de serviço do bem comum a todos os homens e a todos os seres.
6. Há todavia a possibilidade de se conceber e praticar uma outra forma, não de nacionalismo, mas de patriotismo, o patriotismo trans-patriótico e universalista, que, sem se desenraizar da realidade mais concreta e imediata num transnacionalismo ou universalismo vazio e abstracto, apenas preze, cultive e promova, numa determinada tradição histórico-cultural e numa determinada nação ou pátria, aquilo que na sua singularidade houver de melhor, ou seja, a sua aspiração ao e contributo para o bem comum universal, não só dos homens, mas de todos os seres. O patriotismo trans-patriótico e universalista é o que em última instância aspira a orientar as energias ético-espirituais, culturais e sócio-político-económicas de uma dada nação ou pátria para que se superem tanto quanto possível as fronteiras e barreiras, primeiro mentais e afectivas, e depois institucionais e territoriais, entre todos os povos e culturas, de modo a que a comunidade humana possa expressar o mais possível, sem prejuízo das diferenças inerentes à sua constituição plural e complexa, a natureza e as leis fundamentais da própria realidade: ausência de id-entidades substanciais com características intrínsecas, interdependência, impermanência. O patriotismo trans-patriótico e universalista é o que aspira a converter muros em pontes e a romper o círculo vicioso e infernal em que tem decorrido e decorre a história da civilização humana, devolvendo a humanidade e o mundo ao Paraíso – ou seja, à paz, sabedoria e liberdade primordial - que no seu íntimo encobrem. O patriotismo trans-patriótico e universalista é o único que está de acordo com a milenar tradição sapiencial da humanidade e com a ciência contemporânea, convergindo para a verdadeira evolução que é a da consciência e para o verdadeiro progresso e des-envolvimento que é o ético-espiritual, entendendo por tal o despertar da dualidade que permita ver e sentir o outro como a si mesmo e assim contribuir para a emancipação mental, cultural, social, política e económica de todos os homens, bem como para o respeito da harmonia ecológica e do direito à vida e ao bem-estar de todos os seres sencientes.
7. Este patriotismo trans-patriótico e universalista é o que encontro no melhor da ideia de Portugal e da comunidade lusófona que – depurada do lastro de muitos condicionantes - interpreto em Luís de Camões, Padre António Vieira, Teixeira de Pascoaes, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva, para apenas referir os mais destacados. Foi ele, embora ainda informulado e sem a fundamentação aqui apresentada, que inspirou o Manifesto da Nova Águia e a Declaração de Princípios e Objectivos do MIL – Movimento Internacional Lusófono. Foi o desvio desta amplitude de desígnios e a sua redução ao que interpreto como um mero neonacionalismo lusófono que me levou a demitir-me de presidente deste último movimento e a redigir o Manifesto “Refundar Portugal” (umoutroportugal.blogspot.com). É apenas à luz do patriotismo trans-patriótico e universalista, como projecto fundamentalmente ético-espiritual e só a partir daí cultural, cívico, social, político e económico, que considero possível uma mudança fundamental nos rumos sombrios do actual fim de ciclo civilizacional. Não parece haver possibilidade de real transformação do mundo que não se enraíze primeiro numa profunda transformação da mente que o percepciona. A grande Revolução presente e futura, cada vez mais emergente em todo o planeta, é a união inseparável dessa transformação mental – a que alguns chamam “meditação” - e de todas as esferas da actividade humana, incluindo a económica e a política. Quando digo “transformação mental” refiro-me ao simples treino da mente para ver as coisas como são, transcendendo a dualidade, os conceitos e os juízos, o apego e a aversão, o medo e a expectativa, o passado, o presente e o futuro, na experiência do aqui e agora de cada instante, iluminada pelo amor e pela compaixão. Nada de necessariamente religioso, místico, esotérico ou exótico e que não vem do Oriente porque a mais profunda cultura ocidental, clássica ou cristã, sempre o conheceu. É a redescoberta disso, mais do que qualquer ideologia laica ou religiosa, a grande novidade que cresce hoje como bola de neve em todo o mundo.
8. Exorto a que divulguem, discutam e enviem sugestões para aperfeiçoar o Manifesto “Refundar Portugal”, de modo a que possamos praticar estas ideias e trazer desde já para a nossa vida quotidiana essa diferença que consideramos essencial para o mundo: abertura, clareza e paz da mente e do coração, capacidade de diálogo e compreensão, amor aos homens e aos seres vivos - para além das diferenças de nação, língua, etnia, cultura, religião, ideologia e espécie - , promoção e pedagogia dos valores mais benignos e universais das culturas lusófonas em diálogo com os de todas as culturas planetárias, intervenção cívica, cultural e social que afirme estes valores na esfera pública, política e económica.
umoutroportugal.blogspot.com
Um espaço para reinventar Portugal como nação de todo o Mundo, que estabeleça pontes, mediações e diálogos entre todos os povos, culturas e civilizações e promova os valores mais universalistas, conforme o símbolo da Esfera Armilar. Há que visar o melhor possível para todos, uma cultura da paz, da compreensão e da fraternidade à escala planetária, orientada não só para o bem da espécie humana, mas também para a preservação da natureza e o bem-estar de todas as formas de vida sencientes.
"Nós, Portugal, o poder ser"
- Fernando Pessoa, Mensagem.
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Por um patriotismo trans-patriótico e universalista. Oito considerações para um Outro Portugal
sexta-feira, 18 de dezembro de 2009
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1. A milenar tradição contemplativa e meditativa (transversal às diferentes religiões e espiritualidades, também laicas) e os progressos contemporâneos da microfísica e das neurociências (que hoje se aproximam numa convergência histórica, como nas experiências realizadas no MIT, em Massachusetts, e nos encontros anuais Mind and Life) parecem indicar não ser possível encontrar, quer na constituição da chamada matéria, quer na da chamada mente, ou seja, nisso cujo conjunto designamos por realidade, uma mínima entidade que exista em si e por si e que permaneça idêntica a si mesma, ou seja, que tenha características próprias. Todas as dimensões da chamada realidade parecem obedecer assim a duas leis fundamentais, a de interdependência e a de impermanência, que se resumem na sua ausência de características ou qualidades intrínsecas. Como se pode constatar na mínima experiência perceptiva e como a observação científica confirma, sujeito e objecto constituem-se mutuamente e interagem num dinamismo e numa metamorfose constantes, como meros fenómenos recíprocos, sem essência própria. O conceito de identidade parece ser assim uma abstracção desadequada para expressar o real, sem outro fundamento senão o de ser uma ficção convencional e funcional, que serve o reproduzir de uma tradição fortemente entranhada nos hábitos culturais, psicológicos e sociais do senso comum humano.
2. O conceito de identidade nasce, como o seu correlato, o de alteridade, de uma experiência ingénua e irreflectida, na qual, devido a tendências e hábitos inconscientes, o sujeito se crê distinto do objecto, o eu do não-eu, o mesmo do outro, o idêntico do diferente, ao mesmo tempo que esses termos da experiência se crêem reais e existentes em si e por si, com características e qualidades próprias, positivas, negativas ou neutras, que nunca são mais do que projecção da percepção inconscientemente condicionada. Este estado, que se pode chamar de ignorância dualista, origina três tendências da experiência mental-emocional na relação sujeito-objecto: 1 – o fascínio e o desejo-apego, caso o objecto seja percepcionado como atraente e positivo; 2 – o medo e a aversão, caso o objecto seja percepcionado como repulsivo e negativo; 3 – a indiferença, caso o objecto seja percepcionado como neutro. Qualquer destas experiências resulta em conflito e sofrimento, primeiro interno e depois externo, indissociável de uma extrema vulnerabilidade perante todas as vicissitudes da vida, pois a mente dominada pelo apego e pela aversão não pode assegurar de modo algum a posse do que deseja nem a exclusão do que rejeita, devido à lei da impermanência e metamorfose constantes de tudo, sujeitando-se assim constantemente à carência do que deseja ou ao medo de o perder, bem como à ameaça do que rejeita ou ao medo de o não evitar. Por outro lado, a indiferença é uma falsa alternativa, que apenas gera a experiência de solidão, de entorpecimento mental e despotenciamento vital.
Da ignorância dualista e da combinação das três tendências referidas resultam as pulsões emocionais inerentes a todos os actos e omissões, mentais, verbais e físicos, que as tradições ético-espirituais, teístas ou não-teístas, religiosas ou laicas, designam como actos negativos, faltas, pecados ou toxinas mentais, como hoje alguns preferem: desejo possessivo, ódio e cólera, inveja e ciúme, orgulho e arrogância, avidez e avareza, torpor mental e tristeza, entre muitas outras. Em qualquer dos casos, antes de lesarem os outros, estas pulsões lesam a mente do próprio sujeito a partir do primeiro instante em que nela surgem, distorcendo a percepção da realidade, gerando ignorância, insensibilidade e tormento interior e desarmonizando a circulação da energia vital, o que tem também efeitos somáticos e predispõe o organismo para todo o tipo de doenças. Por isso são objectivamente negativas, independentemente de qualquer doutrina moral ou revelação religiosa.
3. Um olhar desapaixonado e realista sobre o processo e a história da civilização humana, desde os seus primórdios até hoje, não pode deixar de constatar que tudo – a organização social, a ciência, a técnica, a política, a economia, a cultura, a educação e a religião - tem sido predominantemente movido pela ignorância dualista, o apego, a aversão e a indiferença, bem como por todas as suas combinações possíveis, com o resultado evidente, em termos gerais, de a humanidade até hoje sempre ter obtido precisamente o que mais rejeita, o sofrimento, e sempre haver falhado aquilo a que mais aspira, a felicidade: prova evidente de que o desejo-apego e a aversão resultam precisamente no contrário do que buscam. As únicas excepções a esta monumental ilusão e a este grandioso fracasso histórico colectivo, habitualmente camuflado com os nomes de “progresso”, “evolução”, “desenvolvimento”, etc., são os seres que despertam e se libertam da ignorância dualista e das suas consequências mentais e emocionais: aqueles que as várias tradições designam como sábios, santos, etc., e que são considerados mestres espirituais quando à libertação individual acrescentam o amor e a compaixão de continuarem a agir, interior e exteriormente, para o bem e a libertação dos outros.
4. Aplicada à questão das sociedades, das culturas, das nações e das pátrias, esta visão constata que nenhuma delas existe em si e por si, com uma identidade e características permanentes e irredutivelmente próprias. Todas, pelo contrário, apesar de apresentarem complexas singularidades em devir, nascem, vivem e morrem ou metamorfoseiam-se de acordo com as leis fundamentais de interdependência e impermanência que abrangem todas as dimensões do real. Com efeito, quem pode, por exemplo, pensar o que é Portugal separando a sua história e cultura das de todos (ou quase) os povos europeus, africanos, sul-americanos e orientais, sem rejeitar que no plano da língua e da mesma história e cultura existem afinidades mais imediatas com as nações lusófonas? O conceito de identidade nacional é pois, tal como o de identidade pessoal - sobretudo se pensado de forma essencialista ou substancialista, como algo que em si e por si pré-exista ou exista fora de um devir interdependente com todas as formas de alteridade - , uma mera abstracção que em última instância apenas funciona na lógica da ignorância dualista que predomina na mente humana.
5. Tal como acontece quando se extrema a bipolarização eu-outro, o extremar da suposta identidade cultural ou nacional como uma essência única, permanente e independente das demais, conduz as mentes ao nacionalismo ou ao patriotismo ensimesmado que potenciam essa ignorância dualista e esses complexos de apego ao que parece ser próprio e de indiferença ou aversão ao que parece ser alheio, o que já vimos serem as causas fundamentais de insensibilidade, sofrimento e conflito para quem por elas se deixa dominar e para quem lhe sofre as acções daí decorrentes. O nacionalismo ou patriotismo comum, levando a amar a sua cultura, nação ou pátria acima das demais, é pois injustificável e condenável em termos espirituais, sapienciais e éticos, sendo incompatível com qualquer projecto de emancipação da consciência e de serviço do bem comum a todos os homens e a todos os seres.
6. Há todavia a possibilidade de se conceber e praticar uma outra forma, não de nacionalismo, mas de patriotismo, o patriotismo trans-patriótico e universalista, que, sem se desenraizar da realidade mais concreta e imediata num transnacionalismo ou universalismo vazio e abstracto, apenas preze, cultive e promova, numa determinada tradição histórico-cultural e numa determinada nação ou pátria, aquilo que na sua singularidade houver de melhor, ou seja, a sua aspiração ao e contributo para o bem comum universal, não só dos homens, mas de todos os seres. O patriotismo trans-patriótico e universalista é o que em última instância aspira a orientar as energias ético-espirituais, culturais e sócio-político-económicas de uma dada nação ou pátria para que se superem tanto quanto possível as fronteiras e barreiras, primeiro mentais e afectivas, e depois institucionais e territoriais, entre todos os povos e culturas, de modo a que a comunidade humana possa expressar o mais possível, sem prejuízo das diferenças inerentes à sua constituição plural e complexa, a natureza e as leis fundamentais da própria realidade: ausência de id-entidades substanciais com características intrínsecas, interdependência, impermanência. O patriotismo trans-patriótico e universalista é o que aspira a converter muros em pontes e a romper o círculo vicioso e infernal em que tem decorrido e decorre a história da civilização humana, devolvendo a humanidade e o mundo ao Paraíso – ou seja, à paz, sabedoria e liberdade primordial - que no seu íntimo encobrem. O patriotismo trans-patriótico e universalista é o único que está de acordo com a milenar tradição sapiencial da humanidade e com a ciência contemporânea, convergindo para a verdadeira evolução que é a da consciência e para o verdadeiro progresso e des-envolvimento que é o ético-espiritual, entendendo por tal o despertar da dualidade que permita ver e sentir o outro como a si mesmo e assim contribuir para a emancipação mental, cultural, social, política e económica de todos os homens, bem como para o respeito da harmonia ecológica e do direito à vida e ao bem-estar de todos os seres sencientes.
7. Este patriotismo trans-patriótico e universalista é o que encontro no melhor da ideia de Portugal e da comunidade lusófona que – depurada do lastro de muitos condicionantes - interpreto em Luís de Camões, Padre António Vieira, Teixeira de Pascoaes, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva, para apenas referir os mais destacados. Foi ele, embora ainda informulado e sem a fundamentação aqui apresentada, que inspirou o Manifesto da Nova Águia e a Declaração de Princípios e Objectivos do MIL – Movimento Internacional Lusófono. Foi o desvio desta amplitude de desígnios e a sua redução ao que interpreto como um mero neonacionalismo lusófono que me levou a demitir-me de presidente deste último movimento e a redigir o Manifesto “Refundar Portugal” (umoutroportugal.blogspot.com). É apenas à luz do patriotismo trans-patriótico e universalista, como projecto fundamentalmente ético-espiritual e só a partir daí cultural, cívico, social, político e económico, que considero possível uma mudança fundamental nos rumos sombrios do actual fim de ciclo civilizacional. Não parece haver possibilidade de real transformação do mundo que não se enraíze primeiro numa profunda transformação da mente que o percepciona. A grande Revolução presente e futura, cada vez mais emergente em todo o planeta, é a união inseparável dessa transformação mental – a que alguns chamam “meditação” - e de todas as esferas da actividade humana, incluindo a económica e a política. Quando digo “transformação mental” refiro-me ao simples treino da mente para ver as coisas como são, transcendendo a dualidade, os conceitos e os juízos, o apego e a aversão, o medo e a expectativa, o passado, o presente e o futuro, na experiência do aqui e agora de cada instante, iluminada pelo amor e pela compaixão. Nada de necessariamente religioso, místico, esotérico ou exótico e que não vem do Oriente porque a mais profunda cultura ocidental, clássica ou cristã, sempre o conheceu. É a redescoberta disso, mais do que qualquer ideologia laica ou religiosa, a grande novidade que cresce hoje como bola de neve em todo o mundo.
8. Exorto a que divulguem, discutam e enviem sugestões para aperfeiçoar o Manifesto “Refundar Portugal”, de modo a que possamos praticar estas ideias e trazer desde já para a nossa vida quotidiana essa diferença que consideramos essencial para o mundo: abertura, clareza e paz da mente e do coração, capacidade de diálogo e compreensão, amor aos homens e aos seres vivos - para além das diferenças de nação, língua, etnia, cultura, religião, ideologia e espécie - , promoção e pedagogia dos valores mais benignos e universais das culturas lusófonas em diálogo com os de todas as culturas planetárias, intervenção cívica, cultural e social que afirme estes valores na esfera pública, política e económica.
umoutroportugal.blogspot.com
2. O conceito de identidade nasce, como o seu correlato, o de alteridade, de uma experiência ingénua e irreflectida, na qual, devido a tendências e hábitos inconscientes, o sujeito se crê distinto do objecto, o eu do não-eu, o mesmo do outro, o idêntico do diferente, ao mesmo tempo que esses termos da experiência se crêem reais e existentes em si e por si, com características e qualidades próprias, positivas, negativas ou neutras, que nunca são mais do que projecção da percepção inconscientemente condicionada. Este estado, que se pode chamar de ignorância dualista, origina três tendências da experiência mental-emocional na relação sujeito-objecto: 1 – o fascínio e o desejo-apego, caso o objecto seja percepcionado como atraente e positivo; 2 – o medo e a aversão, caso o objecto seja percepcionado como repulsivo e negativo; 3 – a indiferença, caso o objecto seja percepcionado como neutro. Qualquer destas experiências resulta em conflito e sofrimento, primeiro interno e depois externo, indissociável de uma extrema vulnerabilidade perante todas as vicissitudes da vida, pois a mente dominada pelo apego e pela aversão não pode assegurar de modo algum a posse do que deseja nem a exclusão do que rejeita, devido à lei da impermanência e metamorfose constantes de tudo, sujeitando-se assim constantemente à carência do que deseja ou ao medo de o perder, bem como à ameaça do que rejeita ou ao medo de o não evitar. Por outro lado, a indiferença é uma falsa alternativa, que apenas gera a experiência de solidão, de entorpecimento mental e despotenciamento vital.
Da ignorância dualista e da combinação das três tendências referidas resultam as pulsões emocionais inerentes a todos os actos e omissões, mentais, verbais e físicos, que as tradições ético-espirituais, teístas ou não-teístas, religiosas ou laicas, designam como actos negativos, faltas, pecados ou toxinas mentais, como hoje alguns preferem: desejo possessivo, ódio e cólera, inveja e ciúme, orgulho e arrogância, avidez e avareza, torpor mental e tristeza, entre muitas outras. Em qualquer dos casos, antes de lesarem os outros, estas pulsões lesam a mente do próprio sujeito a partir do primeiro instante em que nela surgem, distorcendo a percepção da realidade, gerando ignorância, insensibilidade e tormento interior e desarmonizando a circulação da energia vital, o que tem também efeitos somáticos e predispõe o organismo para todo o tipo de doenças. Por isso são objectivamente negativas, independentemente de qualquer doutrina moral ou revelação religiosa.
3. Um olhar desapaixonado e realista sobre o processo e a história da civilização humana, desde os seus primórdios até hoje, não pode deixar de constatar que tudo – a organização social, a ciência, a técnica, a política, a economia, a cultura, a educação e a religião - tem sido predominantemente movido pela ignorância dualista, o apego, a aversão e a indiferença, bem como por todas as suas combinações possíveis, com o resultado evidente, em termos gerais, de a humanidade até hoje sempre ter obtido precisamente o que mais rejeita, o sofrimento, e sempre haver falhado aquilo a que mais aspira, a felicidade: prova evidente de que o desejo-apego e a aversão resultam precisamente no contrário do que buscam. As únicas excepções a esta monumental ilusão e a este grandioso fracasso histórico colectivo, habitualmente camuflado com os nomes de “progresso”, “evolução”, “desenvolvimento”, etc., são os seres que despertam e se libertam da ignorância dualista e das suas consequências mentais e emocionais: aqueles que as várias tradições designam como sábios, santos, etc., e que são considerados mestres espirituais quando à libertação individual acrescentam o amor e a compaixão de continuarem a agir, interior e exteriormente, para o bem e a libertação dos outros.
4. Aplicada à questão das sociedades, das culturas, das nações e das pátrias, esta visão constata que nenhuma delas existe em si e por si, com uma identidade e características permanentes e irredutivelmente próprias. Todas, pelo contrário, apesar de apresentarem complexas singularidades em devir, nascem, vivem e morrem ou metamorfoseiam-se de acordo com as leis fundamentais de interdependência e impermanência que abrangem todas as dimensões do real. Com efeito, quem pode, por exemplo, pensar o que é Portugal separando a sua história e cultura das de todos (ou quase) os povos europeus, africanos, sul-americanos e orientais, sem rejeitar que no plano da língua e da mesma história e cultura existem afinidades mais imediatas com as nações lusófonas? O conceito de identidade nacional é pois, tal como o de identidade pessoal - sobretudo se pensado de forma essencialista ou substancialista, como algo que em si e por si pré-exista ou exista fora de um devir interdependente com todas as formas de alteridade - , uma mera abstracção que em última instância apenas funciona na lógica da ignorância dualista que predomina na mente humana.
5. Tal como acontece quando se extrema a bipolarização eu-outro, o extremar da suposta identidade cultural ou nacional como uma essência única, permanente e independente das demais, conduz as mentes ao nacionalismo ou ao patriotismo ensimesmado que potenciam essa ignorância dualista e esses complexos de apego ao que parece ser próprio e de indiferença ou aversão ao que parece ser alheio, o que já vimos serem as causas fundamentais de insensibilidade, sofrimento e conflito para quem por elas se deixa dominar e para quem lhe sofre as acções daí decorrentes. O nacionalismo ou patriotismo comum, levando a amar a sua cultura, nação ou pátria acima das demais, é pois injustificável e condenável em termos espirituais, sapienciais e éticos, sendo incompatível com qualquer projecto de emancipação da consciência e de serviço do bem comum a todos os homens e a todos os seres.
6. Há todavia a possibilidade de se conceber e praticar uma outra forma, não de nacionalismo, mas de patriotismo, o patriotismo trans-patriótico e universalista, que, sem se desenraizar da realidade mais concreta e imediata num transnacionalismo ou universalismo vazio e abstracto, apenas preze, cultive e promova, numa determinada tradição histórico-cultural e numa determinada nação ou pátria, aquilo que na sua singularidade houver de melhor, ou seja, a sua aspiração ao e contributo para o bem comum universal, não só dos homens, mas de todos os seres. O patriotismo trans-patriótico e universalista é o que em última instância aspira a orientar as energias ético-espirituais, culturais e sócio-político-económicas de uma dada nação ou pátria para que se superem tanto quanto possível as fronteiras e barreiras, primeiro mentais e afectivas, e depois institucionais e territoriais, entre todos os povos e culturas, de modo a que a comunidade humana possa expressar o mais possível, sem prejuízo das diferenças inerentes à sua constituição plural e complexa, a natureza e as leis fundamentais da própria realidade: ausência de id-entidades substanciais com características intrínsecas, interdependência, impermanência. O patriotismo trans-patriótico e universalista é o que aspira a converter muros em pontes e a romper o círculo vicioso e infernal em que tem decorrido e decorre a história da civilização humana, devolvendo a humanidade e o mundo ao Paraíso – ou seja, à paz, sabedoria e liberdade primordial - que no seu íntimo encobrem. O patriotismo trans-patriótico e universalista é o único que está de acordo com a milenar tradição sapiencial da humanidade e com a ciência contemporânea, convergindo para a verdadeira evolução que é a da consciência e para o verdadeiro progresso e des-envolvimento que é o ético-espiritual, entendendo por tal o despertar da dualidade que permita ver e sentir o outro como a si mesmo e assim contribuir para a emancipação mental, cultural, social, política e económica de todos os homens, bem como para o respeito da harmonia ecológica e do direito à vida e ao bem-estar de todos os seres sencientes.
7. Este patriotismo trans-patriótico e universalista é o que encontro no melhor da ideia de Portugal e da comunidade lusófona que – depurada do lastro de muitos condicionantes - interpreto em Luís de Camões, Padre António Vieira, Teixeira de Pascoaes, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva, para apenas referir os mais destacados. Foi ele, embora ainda informulado e sem a fundamentação aqui apresentada, que inspirou o Manifesto da Nova Águia e a Declaração de Princípios e Objectivos do MIL – Movimento Internacional Lusófono. Foi o desvio desta amplitude de desígnios e a sua redução ao que interpreto como um mero neonacionalismo lusófono que me levou a demitir-me de presidente deste último movimento e a redigir o Manifesto “Refundar Portugal” (umoutroportugal.blogspot.com). É apenas à luz do patriotismo trans-patriótico e universalista, como projecto fundamentalmente ético-espiritual e só a partir daí cultural, cívico, social, político e económico, que considero possível uma mudança fundamental nos rumos sombrios do actual fim de ciclo civilizacional. Não parece haver possibilidade de real transformação do mundo que não se enraíze primeiro numa profunda transformação da mente que o percepciona. A grande Revolução presente e futura, cada vez mais emergente em todo o planeta, é a união inseparável dessa transformação mental – a que alguns chamam “meditação” - e de todas as esferas da actividade humana, incluindo a económica e a política. Quando digo “transformação mental” refiro-me ao simples treino da mente para ver as coisas como são, transcendendo a dualidade, os conceitos e os juízos, o apego e a aversão, o medo e a expectativa, o passado, o presente e o futuro, na experiência do aqui e agora de cada instante, iluminada pelo amor e pela compaixão. Nada de necessariamente religioso, místico, esotérico ou exótico e que não vem do Oriente porque a mais profunda cultura ocidental, clássica ou cristã, sempre o conheceu. É a redescoberta disso, mais do que qualquer ideologia laica ou religiosa, a grande novidade que cresce hoje como bola de neve em todo o mundo.
8. Exorto a que divulguem, discutam e enviem sugestões para aperfeiçoar o Manifesto “Refundar Portugal”, de modo a que possamos praticar estas ideias e trazer desde já para a nossa vida quotidiana essa diferença que consideramos essencial para o mundo: abertura, clareza e paz da mente e do coração, capacidade de diálogo e compreensão, amor aos homens e aos seres vivos - para além das diferenças de nação, língua, etnia, cultura, religião, ideologia e espécie - , promoção e pedagogia dos valores mais benignos e universais das culturas lusófonas em diálogo com os de todas as culturas planetárias, intervenção cívica, cultural e social que afirme estes valores na esfera pública, política e económica.
umoutroportugal.blogspot.com
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Manifesto
2010 é o ano em que passa um século sobre a implantação da República em Portugal e no início de 2011 realizar-se-ão eleições presidenciais. Independentemente da questão do regime, 2010 impõe-se como um marco fundamental para lançar uma reflexão pública sobre o país e o mundo que temos e queremos. Reflexão tanto mais urgente quanto há sinais cada vez mais evidentes do crescente divórcio entre o Estado e a sociedade, traduzido em eleições onde a abstenção triunfa sistematicamente, fruto do descrédito galopante da classe política, da própria política e do deserto de ideias em que vivemos, mas também do comodismo e indiferentismo dos portugueses, que muito criticam, mas dificilmente buscam conceber alternativas e pô-las em prática.
Aqui se apresenta a proposta de um cidadão português que, no decurso da sua docência universitária, obra publicada e intervenção cultural, tem seguido com interesse e preocupação os rumos recentes de Portugal e do mundo. Convicto de que urge refundar Portugal, eis uma lista de prioridades para o país e o mundo melhor a que temos direito e que todos temos o dever de construir. Agradecem-se os contributos críticos, de modo a que a proposta se aperfeiçoe e complete e sirva de plataforma para a discussão pública e a intervenção cultural e cívica que visa, pelos meios que se verificarem ser os mais oportunos.
I – Portugal é uma nação que, pela diáspora planetária da sua história e cultura, pela situação geográfica e pela língua, com 240 milhões de falantes em toda a comunidade lusófona, tem a potencialidade de ser uma nação cosmopolita, uma nação de todo o mundo, que estabeleça pontes, mediações e diálogos entre todos os povos, culturas e civilizações. Este perfil vocaciona-nos para o cultivo dos valores mais universalistas, promovendo o diálogo com todas as culturas mundiais. Os valores mais universalistas são aqueles que promovam o melhor possível para todos, uma cultura da paz, da compreensão e da fraternidade à escala planetária, visando não apenas o bem da espécie humana, mas também a preservação da natureza e do bem-estar de todas as formas de vida animal, como condição da própria qualidade e dignidade da vida humana.
II – O nosso potencial universalista tem sido sistematicamente ignorado pelas nossas orientações governativas, desde a época dos Descobrimentos até hoje. Se no passado predominou a pretensão de dilatar a Fé e o Império, hoje predomina a sujeição da nação aos novos senhores do mundo, as grandes esferas de interesses político-económicos. Portugal está ao serviço da globalização de um paradigma de desenvolvimento económico-tecnológico que explora desenfreadamente os recursos naturais e instrumentaliza homens e animais, donde resulta um enorme sofrimento, um fosso crescente entre homens, classes, povos e nações, a redução da biodiversidade e o arrastar do planeta para uma crise sem precedentes.
III – A assunção do nosso potencial universalista implica uma reforma das mentalidades, com plena expressão ética, cultural, social, política e económica. Nesse sentido se propõem as seguintes medidas urgentes, que visam implementar entre nós um novo paradigma, convergente com as melhores aspirações humanas e com os grandes desafios deste início do século XXI:
1 – Portugal deve dar prioridade absoluta a um desenvolvimento económico sustentado, que salvaguarde a harmonia ecológica e o bem-estar da população humana e animal. A Constituição da República Portuguesa deve consagrar a senciência dos animais – a sua capacidade de sentir dor e prazer - e o seu direito à vida e ao bem-estar. Portugal deve aprender com a legislação das nações europeias mais evoluídas neste domínio, adaptando-a à realidade nacional.
2 – Portugal deve ensaiar modelos de desenvolvimento alternativos, que preservem e promovam a diversidade cultural, biológica e ecoregional. Há que promover a sustentabilidade económica do país, desenvolvendo as economias locais. Devem-se substituir quanto possível as energias não-renováveis (petróleo, carvão, gás natural, energia nuclear), por energias renováveis e alternativas (solar, eólica, hidráulica, marmotriz, etc.), superando o paradigma, a vulnerabilidade e as dependências de uma economia baseada no petróleo e nos hidrocarbonetos. Deve-se particularmente explorar as potencialidades energéticas dos nossos mais de 900 km de costa.
3 - Devem-se ensaiar formas de organização económica cujo objectivo fundamental não seja apenas o lucro financeiro. Deve-se assegurar o predomínio da ética e da política sobre a economia, de modo a que a produção e distribuição da riqueza vise o bem comum do ecossistema e dos seres vivos, a satisfação das necessidades básicas dos homens e a melhoria geral da sua qualidade de vida, bem como o acesso de todos à educação e à cultura.
4 - Deve-se investir num programa pedagógico de redução das necessidades artificiais que permita oferecer alternativas ao produtivismo e consumismo, fazendo do trabalho e do desenvolvimento económico não um fim em si, com o inevitável dano da harmonia ecológica, da biodiversidade e do bem-estar de homens e animais, mas um mero meio para a fruição de um crescente tempo livre de modo mais gratificante e criativo. Deve-se fiscalizar mais rigorosamente o crédito ao consumo, de forma a evitar o crescente endividamento das famílias.
5 – Há que criar um serviço público de saúde eficiente e acessível a todos, que inclua a possibilidade de optar por medicinas e terapias alternativas, de qualidade e eficácia comprovada, como a homeopatia, a acupunctura, a osteopatia, o shiatsu, o yoga, a meditação, etc. Estas opções, bem como os medicamentos naturais e alternativos, devem ser igualmente comparticipadas pelo Estado.
6 – Importa informar e sensibilizar a população para os efeitos nocivos de vários hábitos alimentares - nomeadamente o consumo excessivo de carne - , para o meio ambiente, a saúde pública e o bem-estar de homens e animais. Sendo uma das principais causas do aquecimento global, do esgotamento dos recursos naturais e do sofrimento dos animais, há que restringir e criar alternativas à agropecuária intensiva. Deve-se divulgar a possibilidade de se viver saudavelmente com uma alimentação não-carnívora, vegetariana ou vegan e devem-se reduzir os impostos sobre os produtos de origem natural e biológica.
7 - Portugal, a par do desenvolvimento económico sustentado, deve investir sobretudo nos domínios da saúde, da educação e da cultura, não só tecnológica, mas filosófica, literária, artística e científica. O Orçamento do Estado deve reflectir isso, reduzindo os gastos com a Defesa, o Exército e as obras públicas de fachada. Urge moralizar e reduzir os salários e reformas de presidentes, ministros, deputados e detentores de cargos na administração pública e privada, a par do aumento dos impostos sobre os grandes rendimentos.
8 - Redignificar, com exigência, os professores e todos os profissionais ligados à educação e à cultura. A educação e a cultura não devem estar dependentes de critérios economicistas e das flutuações do mercado de emprego. Os vários níveis de ensino visarão a formação integral da pessoa, não a sacrificando a uma mera funcionalização profissional. A par disto, há que sensibilizar as famílias para não abandonarem as crianças em frente dos computadores e dos maus programas de televisão. A televisão pública deve melhorar o seu nível, investindo mais em programas de informação e formação.
Nos vários níveis de ensino deve ser introduzida uma disciplina que sensibilize para o respeito pela natureza, a vida humana e a vida animal, bem como outra que informe sobre a diversidade de paradigmas culturais, morais e religiosos coexistentes nas sociedades contemporâneas. Nos mesmos níveis de ensino deve estar presente a cultura portuguesa e lusófona, bem como as várias culturas planetárias. Um português culto e bem formado deve ter uma consciência lusófona e universal, não apenas europeia-ocidental.
A meditação, com benefícios científicamente reconhecidos - quanto ao equilíbrio e saúde psicofisiológicos, ao aumento da concentração e da memória, à melhoria na aprendizagem, à maior eficiência no trabalho e à harmonia nas relações humanas - , deve ser facultada em todos os níveis dos currículos escolares, em termos puramente laicos, sem qualquer componente religiosa.
9 - Portugal deve assumir-se na primeira linha da defesa dos direitos humanos e dos seres vivos em todos os pontos do planeta em que sejam violados, sem obedecer a pressões políticas ou económicas internacionais. Portugal deve ser um lugar de bom acolhimento para todos os emigrantes e estrangeiros que o procurem para trabalhar e viver.
10 – Portugal deve aprofundar as relações culturais, económicas e políticas com as nações de língua portuguesa, incluindo a região da Galiza, Goa, Damão, Diu, Macau e os outros lugares da nossa diáspora onde se fala o português, sensibilizando a comunidade lusófona para as causas universais, ambientais, humanitárias e animais.
11 - Portugal deve promover a Lusofonia e os valores universalistas da cultura portuguesa e lusófona no mundo, dando o seu melhor exemplo e contributo para converter a sociedade planetária na possível comunidade ético-cultural e ecuménica visada entre nós por Luís de Camões, Padre António Vieira, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva. Portugal deve assumir-se como um espaço multicultural e de convivência com a diversidade, um espaço privilegiado para o tão actual desafio do diálogo intercultural e inter-religioso, alargado ao diálogo entre crentes e descrentes. Deve precaver-se contudo de tentações neo-imperialistas e de qualquer nacionalismo lusófono ou lusocêntrico. A Lusofonia não deve abafar outras línguas e culturas que existam no seu espaço.
12 - Verifica-se haver em Portugal e na Europa em geral uma grave crise de representação eleitoral, patente na elevada abstenção e descrédito dos políticos, dos partidos e da política, os quais, segundo a opinião geral, apenas promovem o acesso ao poder de indivíduos e grupos que sacrificam o bem comum a interesses pessoais e particulares, com destaque para os das grandes forças económicas. As eleições são assim sistematicamente ganhas por representantes de minorias, relativamente à totalidade dos cidadãos eleitores, que governam isolados da maioria real das populações, que os consideram com alheamento, desconfiança e desprezo, tornando-se vítimas passivas das suas políticas. O actual sistema eleitoral também não promove a melhor justiça representativa, não facilitando a representação de uma maior diversidade de forças políticas e limitando-a às organizações partidárias, o que contribui para a instrumentalização do aparelho de Estado, dos lugares de decisão político-económica e da comunicação social pelos grandes partidos.
Esta é uma situação que compromete seriamente a democracia e que a história ensina anteceder todas as tentativas de soluções ditatoriais. Há que regenerar a democracia em Portugal, reformando o estado e o sistema eleitoral segundo modelos que fomentem a mais ampla participação e intervenção política da sociedade civil, facilitando a representação de novas forças políticas e possibilitando que cidadãos independentes concorram às eleições. Deve-se recuperar a tradição municipalista portuguesa e promover uma regionalização e descentralização administrativa equilibradas, assegurando mecanismos de prevenção e controlo dos despotismos locais.
Há que colocar a política ao serviço da ética e da cultura e mobilizar a população para a intervenção cívica e política em torno dos desafios fundamentais do nosso tempo, com destaque para a protecção da natureza, o bem-estar dos seres vivos e uma nova consciência planetária. Há que mobilizar os cidadãos indiferentes e descrentes da vida política, a enorme percentagem de abstencionistas e todos aqueles que se limitam a votar, para a responsabilidade de reflectirem, discutirem e criarem o melhor destino a dar à nação. Há que, dentro dos quadros democráticos e legais, promover formas alternativas de intervenção cultural, social e cívica, que permitam antecipar tanto quanto possível a realidade desejada, sem depender dos poderes instituídos.
Convicto de que estas medidas permitirão que Portugal recupere o pioneirismo e criatividade que o caracterizou no impulso dos Descobrimentos, mas agora sem escravizar e explorar outros povos, apelo a que todos dêem o vosso contributo para a discussão, aperfeiçoamento e divulgação deste Manifesto. De todos nós depende que ele se constitua na plataforma de um movimento cívico e cultural de reflexão e acção, que nos arranque ao comodismo e passividade em que estamos instalados.
Por um Outro Portugal!
Aqui se apresenta a proposta de um cidadão português que, no decurso da sua docência universitária, obra publicada e intervenção cultural, tem seguido com interesse e preocupação os rumos recentes de Portugal e do mundo. Convicto de que urge refundar Portugal, eis uma lista de prioridades para o país e o mundo melhor a que temos direito e que todos temos o dever de construir. Agradecem-se os contributos críticos, de modo a que a proposta se aperfeiçoe e complete e sirva de plataforma para a discussão pública e a intervenção cultural e cívica que visa, pelos meios que se verificarem ser os mais oportunos.
I – Portugal é uma nação que, pela diáspora planetária da sua história e cultura, pela situação geográfica e pela língua, com 240 milhões de falantes em toda a comunidade lusófona, tem a potencialidade de ser uma nação cosmopolita, uma nação de todo o mundo, que estabeleça pontes, mediações e diálogos entre todos os povos, culturas e civilizações. Este perfil vocaciona-nos para o cultivo dos valores mais universalistas, promovendo o diálogo com todas as culturas mundiais. Os valores mais universalistas são aqueles que promovam o melhor possível para todos, uma cultura da paz, da compreensão e da fraternidade à escala planetária, visando não apenas o bem da espécie humana, mas também a preservação da natureza e do bem-estar de todas as formas de vida animal, como condição da própria qualidade e dignidade da vida humana.
II – O nosso potencial universalista tem sido sistematicamente ignorado pelas nossas orientações governativas, desde a época dos Descobrimentos até hoje. Se no passado predominou a pretensão de dilatar a Fé e o Império, hoje predomina a sujeição da nação aos novos senhores do mundo, as grandes esferas de interesses político-económicos. Portugal está ao serviço da globalização de um paradigma de desenvolvimento económico-tecnológico que explora desenfreadamente os recursos naturais e instrumentaliza homens e animais, donde resulta um enorme sofrimento, um fosso crescente entre homens, classes, povos e nações, a redução da biodiversidade e o arrastar do planeta para uma crise sem precedentes.
III – A assunção do nosso potencial universalista implica uma reforma das mentalidades, com plena expressão ética, cultural, social, política e económica. Nesse sentido se propõem as seguintes medidas urgentes, que visam implementar entre nós um novo paradigma, convergente com as melhores aspirações humanas e com os grandes desafios deste início do século XXI:
1 – Portugal deve dar prioridade absoluta a um desenvolvimento económico sustentado, que salvaguarde a harmonia ecológica e o bem-estar da população humana e animal. A Constituição da República Portuguesa deve consagrar a senciência dos animais – a sua capacidade de sentir dor e prazer - e o seu direito à vida e ao bem-estar. Portugal deve aprender com a legislação das nações europeias mais evoluídas neste domínio, adaptando-a à realidade nacional.
2 – Portugal deve ensaiar modelos de desenvolvimento alternativos, que preservem e promovam a diversidade cultural, biológica e ecoregional. Há que promover a sustentabilidade económica do país, desenvolvendo as economias locais. Devem-se substituir quanto possível as energias não-renováveis (petróleo, carvão, gás natural, energia nuclear), por energias renováveis e alternativas (solar, eólica, hidráulica, marmotriz, etc.), superando o paradigma, a vulnerabilidade e as dependências de uma economia baseada no petróleo e nos hidrocarbonetos. Deve-se particularmente explorar as potencialidades energéticas dos nossos mais de 900 km de costa.
3 - Devem-se ensaiar formas de organização económica cujo objectivo fundamental não seja apenas o lucro financeiro. Deve-se assegurar o predomínio da ética e da política sobre a economia, de modo a que a produção e distribuição da riqueza vise o bem comum do ecossistema e dos seres vivos, a satisfação das necessidades básicas dos homens e a melhoria geral da sua qualidade de vida, bem como o acesso de todos à educação e à cultura.
4 - Deve-se investir num programa pedagógico de redução das necessidades artificiais que permita oferecer alternativas ao produtivismo e consumismo, fazendo do trabalho e do desenvolvimento económico não um fim em si, com o inevitável dano da harmonia ecológica, da biodiversidade e do bem-estar de homens e animais, mas um mero meio para a fruição de um crescente tempo livre de modo mais gratificante e criativo. Deve-se fiscalizar mais rigorosamente o crédito ao consumo, de forma a evitar o crescente endividamento das famílias.
5 – Há que criar um serviço público de saúde eficiente e acessível a todos, que inclua a possibilidade de optar por medicinas e terapias alternativas, de qualidade e eficácia comprovada, como a homeopatia, a acupunctura, a osteopatia, o shiatsu, o yoga, a meditação, etc. Estas opções, bem como os medicamentos naturais e alternativos, devem ser igualmente comparticipadas pelo Estado.
6 – Importa informar e sensibilizar a população para os efeitos nocivos de vários hábitos alimentares - nomeadamente o consumo excessivo de carne - , para o meio ambiente, a saúde pública e o bem-estar de homens e animais. Sendo uma das principais causas do aquecimento global, do esgotamento dos recursos naturais e do sofrimento dos animais, há que restringir e criar alternativas à agropecuária intensiva. Deve-se divulgar a possibilidade de se viver saudavelmente com uma alimentação não-carnívora, vegetariana ou vegan e devem-se reduzir os impostos sobre os produtos de origem natural e biológica.
7 - Portugal, a par do desenvolvimento económico sustentado, deve investir sobretudo nos domínios da saúde, da educação e da cultura, não só tecnológica, mas filosófica, literária, artística e científica. O Orçamento do Estado deve reflectir isso, reduzindo os gastos com a Defesa, o Exército e as obras públicas de fachada. Urge moralizar e reduzir os salários e reformas de presidentes, ministros, deputados e detentores de cargos na administração pública e privada, a par do aumento dos impostos sobre os grandes rendimentos.
8 - Redignificar, com exigência, os professores e todos os profissionais ligados à educação e à cultura. A educação e a cultura não devem estar dependentes de critérios economicistas e das flutuações do mercado de emprego. Os vários níveis de ensino visarão a formação integral da pessoa, não a sacrificando a uma mera funcionalização profissional. A par disto, há que sensibilizar as famílias para não abandonarem as crianças em frente dos computadores e dos maus programas de televisão. A televisão pública deve melhorar o seu nível, investindo mais em programas de informação e formação.
Nos vários níveis de ensino deve ser introduzida uma disciplina que sensibilize para o respeito pela natureza, a vida humana e a vida animal, bem como outra que informe sobre a diversidade de paradigmas culturais, morais e religiosos coexistentes nas sociedades contemporâneas. Nos mesmos níveis de ensino deve estar presente a cultura portuguesa e lusófona, bem como as várias culturas planetárias. Um português culto e bem formado deve ter uma consciência lusófona e universal, não apenas europeia-ocidental.
A meditação, com benefícios científicamente reconhecidos - quanto ao equilíbrio e saúde psicofisiológicos, ao aumento da concentração e da memória, à melhoria na aprendizagem, à maior eficiência no trabalho e à harmonia nas relações humanas - , deve ser facultada em todos os níveis dos currículos escolares, em termos puramente laicos, sem qualquer componente religiosa.
9 - Portugal deve assumir-se na primeira linha da defesa dos direitos humanos e dos seres vivos em todos os pontos do planeta em que sejam violados, sem obedecer a pressões políticas ou económicas internacionais. Portugal deve ser um lugar de bom acolhimento para todos os emigrantes e estrangeiros que o procurem para trabalhar e viver.
10 – Portugal deve aprofundar as relações culturais, económicas e políticas com as nações de língua portuguesa, incluindo a região da Galiza, Goa, Damão, Diu, Macau e os outros lugares da nossa diáspora onde se fala o português, sensibilizando a comunidade lusófona para as causas universais, ambientais, humanitárias e animais.
11 - Portugal deve promover a Lusofonia e os valores universalistas da cultura portuguesa e lusófona no mundo, dando o seu melhor exemplo e contributo para converter a sociedade planetária na possível comunidade ético-cultural e ecuménica visada entre nós por Luís de Camões, Padre António Vieira, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva. Portugal deve assumir-se como um espaço multicultural e de convivência com a diversidade, um espaço privilegiado para o tão actual desafio do diálogo intercultural e inter-religioso, alargado ao diálogo entre crentes e descrentes. Deve precaver-se contudo de tentações neo-imperialistas e de qualquer nacionalismo lusófono ou lusocêntrico. A Lusofonia não deve abafar outras línguas e culturas que existam no seu espaço.
12 - Verifica-se haver em Portugal e na Europa em geral uma grave crise de representação eleitoral, patente na elevada abstenção e descrédito dos políticos, dos partidos e da política, os quais, segundo a opinião geral, apenas promovem o acesso ao poder de indivíduos e grupos que sacrificam o bem comum a interesses pessoais e particulares, com destaque para os das grandes forças económicas. As eleições são assim sistematicamente ganhas por representantes de minorias, relativamente à totalidade dos cidadãos eleitores, que governam isolados da maioria real das populações, que os consideram com alheamento, desconfiança e desprezo, tornando-se vítimas passivas das suas políticas. O actual sistema eleitoral também não promove a melhor justiça representativa, não facilitando a representação de uma maior diversidade de forças políticas e limitando-a às organizações partidárias, o que contribui para a instrumentalização do aparelho de Estado, dos lugares de decisão político-económica e da comunicação social pelos grandes partidos.
Esta é uma situação que compromete seriamente a democracia e que a história ensina anteceder todas as tentativas de soluções ditatoriais. Há que regenerar a democracia em Portugal, reformando o estado e o sistema eleitoral segundo modelos que fomentem a mais ampla participação e intervenção política da sociedade civil, facilitando a representação de novas forças políticas e possibilitando que cidadãos independentes concorram às eleições. Deve-se recuperar a tradição municipalista portuguesa e promover uma regionalização e descentralização administrativa equilibradas, assegurando mecanismos de prevenção e controlo dos despotismos locais.
Há que colocar a política ao serviço da ética e da cultura e mobilizar a população para a intervenção cívica e política em torno dos desafios fundamentais do nosso tempo, com destaque para a protecção da natureza, o bem-estar dos seres vivos e uma nova consciência planetária. Há que mobilizar os cidadãos indiferentes e descrentes da vida política, a enorme percentagem de abstencionistas e todos aqueles que se limitam a votar, para a responsabilidade de reflectirem, discutirem e criarem o melhor destino a dar à nação. Há que, dentro dos quadros democráticos e legais, promover formas alternativas de intervenção cultural, social e cívica, que permitam antecipar tanto quanto possível a realidade desejada, sem depender dos poderes instituídos.
Convicto de que estas medidas permitirão que Portugal recupere o pioneirismo e criatividade que o caracterizou no impulso dos Descobrimentos, mas agora sem escravizar e explorar outros povos, apelo a que todos dêem o vosso contributo para a discussão, aperfeiçoamento e divulgação deste Manifesto. De todos nós depende que ele se constitua na plataforma de um movimento cívico e cultural de reflexão e acção, que nos arranque ao comodismo e passividade em que estamos instalados.
Por um Outro Portugal!
Contribuidores
- Ana Moreira
- Ana Rodrigues
- Bernardo Almeida
- Dr Carlos Gonçalves
- Duarte D. Braga
- Duarte
- Estudo Geral
- Fernando Emídio
- Gil
- Helena Caetano
- Isabel Rosete
- Isabel Santiago
- João Beato
- João Lopes Aguiar
- José Magalhães
- Luís Miguel Dantas
- Luis Resina
- Luis Resina
- MJC
- Margarida
- Maria de Lourdes Teixeira Puga Alvarez
- Maribel Sobreira
- Maurícia Teles da Silva
- Minda
- Moysés
- P.F. Antunes
- Paulo Borges
- Pedro Miguel Estrela
- Pedro Paz
- Pedro Sena
- Rui Matoso
- Rute Pinheiro
- Sérgio Mago
- Unknown
- aluzdascasas
- ana
- castus
- ethel
- jads
- lurdes
- maria alvarez
- paula