Neste sentido, a cultura deixa de ser considerada um luxo apenas de alguns, para proclamar-se como um direito de todos: cultura cívica. Proclamação cuja real existência requer uma atenta intervenção pública, pois não basta dizer ou escrever que “a cultura é para todos”. É imperativo analisar-se, por exemplo, quem são os utentes dos equipamentos culturais, de modo a verificar que segmentos sociais efectivamente os frequentam ou não, tendo em consideração a composição social da população. E, consequentemente, delinear as estratégias que permitam corrigir essas mesmas assimetrias e diminuir a selectividade social dos públicos da cultura, promovendo a inclusão daqueles que pouco ou nada têm usufruído dos seus direitos humanos e dos seus direitos culturais.
De facto cultura, cidade e sociedade são dimensões em constante interdependência. Não há cidade, nem sociedade sem cultura(s). Por conseguinte, pode dizer-se que cultura e sociedade são mutuamente constitutivas do todo social. A qualidade de uma afecta a plenitude da outra e vice-versa.
É nossa convicção que a arte é por si mesma uma fonte inspiradora de visões do mundo polémicas e não consensuais, pelo que a intervenção em políticas públicas de cultura se deve abster de a programar.
Umas das finalidades fundamentais das políticas públicas de cultura é a de desenvolver o protagonismo cultural da sociedade civil, das populações, dos artistas e criadores, dos grupos amadores, das associações, das indústrias culturais e criativas, na sua potencial diversidade e riqueza de conteúdos. Reduzindo o mais possível o protagonismo do Estado/Governo enquanto “produtor de cultura”, pois este defeito confunde-se na maioria das vezes com a instrumentalização da cultura para fins eleitorais.
Nenhuma política cultural se desenvolve no vazio, nem a partir do vazio. As cidades têm um passado, um presente e um futuro, têm ideias, têm imaginários, têm pessoas e grupos com identidades culturais variadas. As cidades são isso mesmo, a materialização das ideias ao longo do tempo, em ambientes mais ou menos criativos. As cidades devem ser o produto das suas culturas (sempre no plural: culturas), do debate das suas ideias e dos seus valores humanos.
As cidades não podem ser meras máquinas artificiais e administrativas capturadas pelos fluxos globais de hegemonização, da informação e do financiamento. Nem produtos “prontos-a-consumir” enclausuradas numa cultura burocrática.
E quanto a isto não tenhamos ilusões, ou as cidades conseguem mobilizar-se colectivamente e criar dinâmicas adequadas aos novos tempos, ou não. Por todo o mundo, por toda a Europa e em Portugal, o panorama é idêntico: há cidades genuinamente reflexivas e criativas, e há cidades em declínio mais ou menos acentuado.O mesmo vale para os países, claro!
1 comentários:
Posso colocar estas suas notas sobre política cultural no fórum? Com os devidos créditos e um link para aqui, claro.
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