Como limite, junto a um território ignoto ou interdito, perigoso, defendido pela água, as trevas e os montros inonimados, Portugal teria em Sagres o ponto máximo, abruptamente cortado em falésia, que marcará o fim do mundo: ponto onde se encontra a terra dos vivos e a terra dos mortos, o conhecido e o desconhecido, este mundo e o Outro Mundo.
Daí partirão os seus caminhos ignotos e começarão as provas que todo o herói pretendendo penetrar nos mistérios desse Outro Mundo e daí trazer os seus tesouros, tem de percorrer e vencer.
Por isso, desde a nossa proto-história, há testemunhos em Sagres - S. Vicente, dum culto a Crono, o deus da Idade de Ouro, ou da terra paradisíaca da humanidade, e dum culto a Hércules, o herói que desceu aos Infernos, venceu o monstro seu guardador, Cérbero, e conquistou ao Dragão os Pomos de Ouro das Hespérides. E será daqui, deste extremo pátrio dum território extremo eurásico, donde mais tarde partirão os argonautas para a nova aventura, que vencerão os monstros do Mar Tenebroso, conquistarão o ouro da Índia e aportarão às Ilhas Afortunadas como «ilha divina».
Por isso, como terra limite, debruçada sobre esse Mar Tenebroso, aporia humana e terrestre, no espaço e no tempo, na geografia e na história, Portugal estaria desde logo vocacionado para ser terra de iniciação.
Dalila Pereira da Costa, Da Serpente à Imaculada, Porto, Lello e Irmão Editores, 1984, pp.15-16
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