Caros amigos
Permitam que partilhe convosco um texto, um pouco longo, é certo, mas pertinente. Pensei que o poderia enviar ao grupo de política, como uma contribuição à sua reflexão, mas depois decidi que interessa a todos nós, grupo que se assume como aberto a diferentes convicções. Afinal existem muitos portugueses que pensam sobre o estado do mundo!
O texto foi retirado do último número da revista “Utopia”, revista de intervenção anarquista e surge como resposta às criticas levantadas pelo sociólogo João Freire às “21 Teses Sobre o Trabalho” de José Tavares, o autor do texto que passo a transcrever (não na sua totalidade).
“TRABALHO, UMA NOÇÃO QUESTIONADA
O dia em que os donos e senhores da ordem social existente admitirem que a sociedade poderia ser muito diferente daquilo que é nunca chegará. Mais depressa hão-de fundar uma enésima ideologia para provar que esta sociedade (hierarquizada, capitalista, tecnofílica) é a única possível, que não se pode conceber a existência humana sem trabalho assalariado e que uma pessoa, para «ganhar a vida», tem de submeter-se a esse trabalho. Ou seja, que o mundo só assim funciona; que as coisas são «naturalmente» assim.
Ressalvadas as devidas proporções, essa ideia existiu também na mente de muitos revolucionários, de diferentes tendências, inclusive entre libertários ou comunistas que travaram encarniçados combates contra os donos do trabalho. Também para eles as coisas eram assim. De resto, a maioria das pessoas é levada a pensar dessa maneira. É sem dúvida difícil para qualquer um de nós conceber um mundo onde possamos ser donos do nosso próprio tempo, onde não tenhamos de vender algo de nós próprios em troca de dinheiro e de sobreviver consumindo mercadorias. Na impossibilidade de se conceber a vida de outra maneira, são inevitáveis o suplício, a dor, a injustiça, a opressão, expressões que reflectem o modo como funciona o cérebro da grande maioria dos humanos.
Mas pode também conceber-se um mundo em que não exista o trabalho – venda e aluguer do corpo e do tempo, obrigação e dependência, aniquilamento psíquico (e concomitante destruição da biosfera).
Esta contingência crítica manifesta-se mais nitidamente na presente sociedade, que é, por excelência, a sociedade do trabalho, do consumismo, da destruição dos meios elementares da vida e de um neo-autoritarismo um pouco peculiar. E manifesta-se não só porque os seres humanos podem pensar, formulando formas de emancipação, mas também porque as condições reais do trabalho levam as pessoas à prática de um permanente absentismo, de faltas de pontualidade, de supostas doenças, de furtos, de pequenas sabotagens e de outras formas de aversão ao trabalho. Por outro lado, é difícil não vermos que uma parte, pelo menos, das mercadorias produzidas corresponde a desperdícios inúteis, a alimentos desvitalizados ou mesmo nefastos, à construção de habitats desastrosos e concentracionários, ao fabrico de uma crescente panóplia de objectos patológicos. Tal como é difícil não sentir a catástrofe ecológica que está a acontecer por força da industrialização destrutiva e do feiticismo mercantilista, ou não saber que o «trabalho para todos» foi transformado na ilusão de que o trabalho é um privilégio a que somente «os eleitos» têm acesso. E no entanto o trabalho continua a ser aquilo que sempre foi: um instrumento nas mãos de poucos para explorar e supliciar a vida dos restantes.
João Freire (a seguir designado J.F.) desaprecia e tenta retirar sentido às críticas anarquistas, nomeadamente àquelas que exprimi em relação ao trabalho compulsivo. Começa por acusar de ser suposta a ligação entre a palavra trabalho e o termo latino tripalium. Mas até mesmo o professor e investigador José Machado Pais, doutorado em sociologia e licenciado em economia, tem outro entendimento: «o termo trabalho – escreve ele – tem raízes etimológicas no latim: trabalho dizia-se tripalium, que designava também um instrumento de tortura composto por três estacas cruzadas ou paus (do latim palu)». De facto, o substantivo trabalho tem origem no verbo trabalhar, que vem do latim vulgar tripaliare, significando martirizar com o tripalium, através da antiga forma verbal trebalhar. O vocábulo em questão tem origem no baixo latim, podendo ser datado do Concílio de Auxerre, realizado no ano de 578. Ficamos entendidos? Ou andarão os linguistas e historiadores a levantar ficções?
(…) Escreve J.F., comentando o facto de hoje haver anarquistas que criticam sem conciliações o trabalho compulsivo, que «na história do anarquismo nem sempre foi assim (...) sob o paradigma da luta sindical operária, o trabalho era apreciado e encarecido».
J.F. parece ignorar aquilo que se sabe: a história do anarquismo não é apenas feita pelo paradigma da luta sindical e operária, nem sequer por uma única perspectiva de encarar esse mesmo paradigma.
Para os anarquistas que procuravam a unicidade do indivíduo, isto é, a originalidade de todo o ser humano, não se tratava de reconhecer os méritos do trabalho e sobre eles fundar a organização social. Tratava-se de eliminar de uma vez por todas o trabalho, actividade compulsiva, degradante, repressiva e destruidora das condições mais elementares da vida. Alguns (sem todavia se aperceberem da armadilha que a simples perspectiva do prazer implica), basearam o comportamento pessoal e a organização social no «direito ao prazer», título de um texto de José María Blázquez de Pedro, poeta anarquista catalão do início do século XX. E na opinião dos anarquistas naturistas «é preciso abandonar a prática do trabalho», como o formulou Émile Gravelle, fundador do naturismo libertário no final do século XIX, para que exista «uma relação mais harmoniosa com o meio ambiente». Foucques Jeune, outro dos naturistas anarquistas, defendeu o «direito ao pensamento» em oposição ao «direito ao trabalho».
Mesmo os sindicalistas libertários sentiam horror e ódio pelo trabalho, quando este era imposto, sujo, humilhante, perigoso, excessivo, repugnante e mal retribuído. Só quando fosse livre, honrado, respeitado e considerado é que, como refere J.F., «era apreciado e encarecido». É desta aspiração, intrinsecamente ligada a dois princípios do anarquismo, a necessidade de liberdade e de actividade, que nasce o orgulho de saber fazer, o qual não se concilia com a existência de possuidores e desapossados, dirigentes e dirigidos. Segundo os sindicalistas libertários, qualquer sociedade estatal e capitalista jamais será capaz de retribuir o trabalho com justiça, considerando necessário «abandonar qualquer ideia de salariado, quer seja em moeda ou em senhas de trabalho». Kropotkine propôs um horário de trabalho para toda a gente de quatro ou cinco horas semanais, o que, convenhamos, alteraria radicalmente o significado do trabalho como hoje ele é entendido. (…).
Não aceitando o sentido que dou à ordem social, o meu contraditor acusa-me de a depreciar. Mas qual é a ordem social que as Teses Sobre o Trabalho visam? Abreviando: a ordem – aquilo a que se chama ordem – é a coerção e a hierarquização nas relações sociais, é a guerra permanente, o trabalho assalariado e o seu complemento, o desemprego, é a monetarização da presente existência à custa da degradação das condições de vida social e biológica em todo o planeta.
Os anarquistas dos séculos XIX e XX responderam em seu tempo a esta questão; e embora as condições sociais, económicas e políticas se tenham modificado pelo desenvolvimento técnico, estatal e capitalista, alterando bastante a relação com o trabalho, muitas dessas respostas continuam a fazer sentido. «A ordem» – escreveu Kropotkine – «assenta numa maioria de seres humanos que trabalham para que um punhado de parasitas possa usufruir do luxo e dos prazeres e satisfaça as paixões mais execráveis. A ordem é a privação, para essa imensa maioria, de tudo o que corresponde às condições necessárias a uma vida saudável. É esta a ordem.»
(…) J.F. diz que eu faço a apologia da natureza. Admito que sou, desde há muito, um defensor da natureza, porém, sem a divinizar. Não concordo com a submissão do ser humano à natureza ou a redução do ser humano a pura natureza, porque isso implicaria uma redução do pensamento em direcção a formas irracionais. Todavia, tal como os anarquistas naturistas, vegetarianos, dietéticos, verdes, bem como muitos ecologistas, defendo que a liberdade do ser humano não pode advir de um apoderamento colectivo das forças da natureza, mas sim da adaptação a essas mesmas forças. Para a maioria dos libertários de diferentes tendências, tal como para os marxistas (comunistas, socialistas, social-democratas), ou para os liberais e democratas de todos os matizes, crentes obstinados no progresso (como J.F. demonstra ser), a separação entre o ser humano e a natureza seria superada através da ciência e da razão. Para todos eles, organizar a sociedade significa organizá-la de modo científico, caminhando os seres humanos de mãos dadas com a ciência rumo à liberdade e à abundância. Tal progresso significa que a natureza é pasto exclusivo das forças produtivas e paisagem da escravatura salarial. Como se os humanos fossem a única espécie existente no planeta e as instituições de dominação fossem a única forma de opressão a considerar. A exploração e destruição da natureza são o outro lado da exploração e opressão do homem pelo homem. Também não é somente o Estado que permite o longo prolongamento do actual modo de existência ou a sua expansão por todo o planeta. Para além da forma social, política e económica existente, é preciso ter presente as técnicas de extracção e gestão da energia, de alimentação (a tal merda que engolimos todos os dias), mesmo que isso se faça de «forma sustentável», uma vez que essa sustentabilidade que agora propõem continua a implicar a domesticação da natureza e o ecocídio. A degradação das condições de vida social e biológica no planeta (desaparecimento das florestas, contaminação ambiental e alimentar, mudanças climáticas, doenças ou fenómenos degenerativos produzidos nas plantas, animais e espécie humana) são consequência da colonização tecnológica da sociedade, ou seja, da domesticação do homem pela tecnofilia. Assim, do meu ponto de vista, encontrando-se o trabalho alicerçado na submissão da natureza ao progresso humano, a ideia de um trabalho realizador, promotor de autonomia, é pura fantasia. Se continuarmos a encarar a natureza como um lugar passivo onde se desenrola a luta (ou, mais propriamente, a guerra) pela existência humana, sob a dominação ou não do Estado, nunca poderemos apreender que, por exemplo, a liberdade e a autonomia dependem de uma relação pacífica com a biosfera. Se a natureza se deve humanizar – como já afirmavam os anarquistas naturianistas do século XIX –, o homem, quanto a ele, deve naturalizar-se.
O ser humano não se humaniza com o trabalho, é o contrário que acontece. Deveria estar aqui bem claro que o trabalho subentende a apropriação, por quem manda, das faculdades, energias e realizações dos que nessa relação se encontram na situação de súbditos. Tomar posse dos actos produtivos de alguém é o mesmo que apoderar-se do seu tempo, dirigindo-o para a execução das tarefas lucrativas. Durante uma parte importante das vinte e quatro horas que constituem um dia, semelhante processo transforma em proprietários dessas pessoas os indivíduos que detêm um tal poder. Exercem o direito de propriedade sobre os indivíduos da mesma maneira que o controlo e o poder de decisão legal sobre um animal ou objecto inanimado implicam um direito de propriedade. Que uma pessoa venda o seu tempo de trabalho e passe determinado tempo em deslocações obrigatórias e no consumo de mercadorias são as actividades que caracterizam a vida quotidiana do nosso tempo. Mas não são manifestações intemporais da natureza humana.
Os seres humanos aceitam dinheiro como equivalente da vida, não porque isso decorra da sua natureza de humanos, mas porque vender as suas competências no mercado é a única possibilidade de sobrevivência (policialmente administrada) que lhes resta no contexto do capitalismo. Aliás, a actividade humana só é considerada «produtiva» e «socialmente útil» quando é actividade vendida. Neste contexto civilizacional, o ser humano só «constrói humanidade», para utilizar uma expressão de J.F., quando vende o seu tempo e a sua vida. Deste modo, a sua actividade enquanto trabalhador reveste o carácter de uma prostituição universal. O trabalho é apenas um meio de «ganhar dinheiro», a vida é tão-somente uma forma de ir sobrevivendo. E isto, João Freire, não é brincadeira nenhuma, é muito prosaicamente «o pão nosso de cada dia».”
segunda-feira, 25 de janeiro de 2010
Publicada por paula à(s) 00:34Etiquetas: crítica social, trabalho
Permitam que partilhe convosco um texto, um pouco longo, é certo, mas pertinente. Pensei que o poderia enviar ao grupo de política, como uma contribuição à sua reflexão, mas depois decidi que interessa a todos nós, grupo que se assume como aberto a diferentes convicções. Afinal existem muitos portugueses que pensam sobre o estado do mundo!
O texto foi retirado do último número da revista “Utopia”, revista de intervenção anarquista e surge como resposta às criticas levantadas pelo sociólogo João Freire às “21 Teses Sobre o Trabalho” de José Tavares, o autor do texto que passo a transcrever (não na sua totalidade).
“TRABALHO, UMA NOÇÃO QUESTIONADA
O dia em que os donos e senhores da ordem social existente admitirem que a sociedade poderia ser muito diferente daquilo que é nunca chegará. Mais depressa hão-de fundar uma enésima ideologia para provar que esta sociedade (hierarquizada, capitalista, tecnofílica) é a única possível, que não se pode conceber a existência humana sem trabalho assalariado e que uma pessoa, para «ganhar a vida», tem de submeter-se a esse trabalho. Ou seja, que o mundo só assim funciona; que as coisas são «naturalmente» assim.
Ressalvadas as devidas proporções, essa ideia existiu também na mente de muitos revolucionários, de diferentes tendências, inclusive entre libertários ou comunistas que travaram encarniçados combates contra os donos do trabalho. Também para eles as coisas eram assim. De resto, a maioria das pessoas é levada a pensar dessa maneira. É sem dúvida difícil para qualquer um de nós conceber um mundo onde possamos ser donos do nosso próprio tempo, onde não tenhamos de vender algo de nós próprios em troca de dinheiro e de sobreviver consumindo mercadorias. Na impossibilidade de se conceber a vida de outra maneira, são inevitáveis o suplício, a dor, a injustiça, a opressão, expressões que reflectem o modo como funciona o cérebro da grande maioria dos humanos.
Mas pode também conceber-se um mundo em que não exista o trabalho – venda e aluguer do corpo e do tempo, obrigação e dependência, aniquilamento psíquico (e concomitante destruição da biosfera).
Esta contingência crítica manifesta-se mais nitidamente na presente sociedade, que é, por excelência, a sociedade do trabalho, do consumismo, da destruição dos meios elementares da vida e de um neo-autoritarismo um pouco peculiar. E manifesta-se não só porque os seres humanos podem pensar, formulando formas de emancipação, mas também porque as condições reais do trabalho levam as pessoas à prática de um permanente absentismo, de faltas de pontualidade, de supostas doenças, de furtos, de pequenas sabotagens e de outras formas de aversão ao trabalho. Por outro lado, é difícil não vermos que uma parte, pelo menos, das mercadorias produzidas corresponde a desperdícios inúteis, a alimentos desvitalizados ou mesmo nefastos, à construção de habitats desastrosos e concentracionários, ao fabrico de uma crescente panóplia de objectos patológicos. Tal como é difícil não sentir a catástrofe ecológica que está a acontecer por força da industrialização destrutiva e do feiticismo mercantilista, ou não saber que o «trabalho para todos» foi transformado na ilusão de que o trabalho é um privilégio a que somente «os eleitos» têm acesso. E no entanto o trabalho continua a ser aquilo que sempre foi: um instrumento nas mãos de poucos para explorar e supliciar a vida dos restantes.
João Freire (a seguir designado J.F.) desaprecia e tenta retirar sentido às críticas anarquistas, nomeadamente àquelas que exprimi em relação ao trabalho compulsivo. Começa por acusar de ser suposta a ligação entre a palavra trabalho e o termo latino tripalium. Mas até mesmo o professor e investigador José Machado Pais, doutorado em sociologia e licenciado em economia, tem outro entendimento: «o termo trabalho – escreve ele – tem raízes etimológicas no latim: trabalho dizia-se tripalium, que designava também um instrumento de tortura composto por três estacas cruzadas ou paus (do latim palu)». De facto, o substantivo trabalho tem origem no verbo trabalhar, que vem do latim vulgar tripaliare, significando martirizar com o tripalium, através da antiga forma verbal trebalhar. O vocábulo em questão tem origem no baixo latim, podendo ser datado do Concílio de Auxerre, realizado no ano de 578. Ficamos entendidos? Ou andarão os linguistas e historiadores a levantar ficções?
(…) Escreve J.F., comentando o facto de hoje haver anarquistas que criticam sem conciliações o trabalho compulsivo, que «na história do anarquismo nem sempre foi assim (...) sob o paradigma da luta sindical operária, o trabalho era apreciado e encarecido».
J.F. parece ignorar aquilo que se sabe: a história do anarquismo não é apenas feita pelo paradigma da luta sindical e operária, nem sequer por uma única perspectiva de encarar esse mesmo paradigma.
Para os anarquistas que procuravam a unicidade do indivíduo, isto é, a originalidade de todo o ser humano, não se tratava de reconhecer os méritos do trabalho e sobre eles fundar a organização social. Tratava-se de eliminar de uma vez por todas o trabalho, actividade compulsiva, degradante, repressiva e destruidora das condições mais elementares da vida. Alguns (sem todavia se aperceberem da armadilha que a simples perspectiva do prazer implica), basearam o comportamento pessoal e a organização social no «direito ao prazer», título de um texto de José María Blázquez de Pedro, poeta anarquista catalão do início do século XX. E na opinião dos anarquistas naturistas «é preciso abandonar a prática do trabalho», como o formulou Émile Gravelle, fundador do naturismo libertário no final do século XIX, para que exista «uma relação mais harmoniosa com o meio ambiente». Foucques Jeune, outro dos naturistas anarquistas, defendeu o «direito ao pensamento» em oposição ao «direito ao trabalho».
Mesmo os sindicalistas libertários sentiam horror e ódio pelo trabalho, quando este era imposto, sujo, humilhante, perigoso, excessivo, repugnante e mal retribuído. Só quando fosse livre, honrado, respeitado e considerado é que, como refere J.F., «era apreciado e encarecido». É desta aspiração, intrinsecamente ligada a dois princípios do anarquismo, a necessidade de liberdade e de actividade, que nasce o orgulho de saber fazer, o qual não se concilia com a existência de possuidores e desapossados, dirigentes e dirigidos. Segundo os sindicalistas libertários, qualquer sociedade estatal e capitalista jamais será capaz de retribuir o trabalho com justiça, considerando necessário «abandonar qualquer ideia de salariado, quer seja em moeda ou em senhas de trabalho». Kropotkine propôs um horário de trabalho para toda a gente de quatro ou cinco horas semanais, o que, convenhamos, alteraria radicalmente o significado do trabalho como hoje ele é entendido. (…).
Não aceitando o sentido que dou à ordem social, o meu contraditor acusa-me de a depreciar. Mas qual é a ordem social que as Teses Sobre o Trabalho visam? Abreviando: a ordem – aquilo a que se chama ordem – é a coerção e a hierarquização nas relações sociais, é a guerra permanente, o trabalho assalariado e o seu complemento, o desemprego, é a monetarização da presente existência à custa da degradação das condições de vida social e biológica em todo o planeta.
Os anarquistas dos séculos XIX e XX responderam em seu tempo a esta questão; e embora as condições sociais, económicas e políticas se tenham modificado pelo desenvolvimento técnico, estatal e capitalista, alterando bastante a relação com o trabalho, muitas dessas respostas continuam a fazer sentido. «A ordem» – escreveu Kropotkine – «assenta numa maioria de seres humanos que trabalham para que um punhado de parasitas possa usufruir do luxo e dos prazeres e satisfaça as paixões mais execráveis. A ordem é a privação, para essa imensa maioria, de tudo o que corresponde às condições necessárias a uma vida saudável. É esta a ordem.»
(…) J.F. diz que eu faço a apologia da natureza. Admito que sou, desde há muito, um defensor da natureza, porém, sem a divinizar. Não concordo com a submissão do ser humano à natureza ou a redução do ser humano a pura natureza, porque isso implicaria uma redução do pensamento em direcção a formas irracionais. Todavia, tal como os anarquistas naturistas, vegetarianos, dietéticos, verdes, bem como muitos ecologistas, defendo que a liberdade do ser humano não pode advir de um apoderamento colectivo das forças da natureza, mas sim da adaptação a essas mesmas forças. Para a maioria dos libertários de diferentes tendências, tal como para os marxistas (comunistas, socialistas, social-democratas), ou para os liberais e democratas de todos os matizes, crentes obstinados no progresso (como J.F. demonstra ser), a separação entre o ser humano e a natureza seria superada através da ciência e da razão. Para todos eles, organizar a sociedade significa organizá-la de modo científico, caminhando os seres humanos de mãos dadas com a ciência rumo à liberdade e à abundância. Tal progresso significa que a natureza é pasto exclusivo das forças produtivas e paisagem da escravatura salarial. Como se os humanos fossem a única espécie existente no planeta e as instituições de dominação fossem a única forma de opressão a considerar. A exploração e destruição da natureza são o outro lado da exploração e opressão do homem pelo homem. Também não é somente o Estado que permite o longo prolongamento do actual modo de existência ou a sua expansão por todo o planeta. Para além da forma social, política e económica existente, é preciso ter presente as técnicas de extracção e gestão da energia, de alimentação (a tal merda que engolimos todos os dias), mesmo que isso se faça de «forma sustentável», uma vez que essa sustentabilidade que agora propõem continua a implicar a domesticação da natureza e o ecocídio. A degradação das condições de vida social e biológica no planeta (desaparecimento das florestas, contaminação ambiental e alimentar, mudanças climáticas, doenças ou fenómenos degenerativos produzidos nas plantas, animais e espécie humana) são consequência da colonização tecnológica da sociedade, ou seja, da domesticação do homem pela tecnofilia. Assim, do meu ponto de vista, encontrando-se o trabalho alicerçado na submissão da natureza ao progresso humano, a ideia de um trabalho realizador, promotor de autonomia, é pura fantasia. Se continuarmos a encarar a natureza como um lugar passivo onde se desenrola a luta (ou, mais propriamente, a guerra) pela existência humana, sob a dominação ou não do Estado, nunca poderemos apreender que, por exemplo, a liberdade e a autonomia dependem de uma relação pacífica com a biosfera. Se a natureza se deve humanizar – como já afirmavam os anarquistas naturianistas do século XIX –, o homem, quanto a ele, deve naturalizar-se.
O ser humano não se humaniza com o trabalho, é o contrário que acontece. Deveria estar aqui bem claro que o trabalho subentende a apropriação, por quem manda, das faculdades, energias e realizações dos que nessa relação se encontram na situação de súbditos. Tomar posse dos actos produtivos de alguém é o mesmo que apoderar-se do seu tempo, dirigindo-o para a execução das tarefas lucrativas. Durante uma parte importante das vinte e quatro horas que constituem um dia, semelhante processo transforma em proprietários dessas pessoas os indivíduos que detêm um tal poder. Exercem o direito de propriedade sobre os indivíduos da mesma maneira que o controlo e o poder de decisão legal sobre um animal ou objecto inanimado implicam um direito de propriedade. Que uma pessoa venda o seu tempo de trabalho e passe determinado tempo em deslocações obrigatórias e no consumo de mercadorias são as actividades que caracterizam a vida quotidiana do nosso tempo. Mas não são manifestações intemporais da natureza humana.
Os seres humanos aceitam dinheiro como equivalente da vida, não porque isso decorra da sua natureza de humanos, mas porque vender as suas competências no mercado é a única possibilidade de sobrevivência (policialmente administrada) que lhes resta no contexto do capitalismo. Aliás, a actividade humana só é considerada «produtiva» e «socialmente útil» quando é actividade vendida. Neste contexto civilizacional, o ser humano só «constrói humanidade», para utilizar uma expressão de J.F., quando vende o seu tempo e a sua vida. Deste modo, a sua actividade enquanto trabalhador reveste o carácter de uma prostituição universal. O trabalho é apenas um meio de «ganhar dinheiro», a vida é tão-somente uma forma de ir sobrevivendo. E isto, João Freire, não é brincadeira nenhuma, é muito prosaicamente «o pão nosso de cada dia».”
5 comentários:
- Anónimo disse...
-
Simplificando (demasiado?): O "trabalho" em si não é a causa de mal. Mas o "trabalhador" enquanto se constitui como sujeito de relações de poder instituídas. A questão será constituir um modelo de agir em que o trabalho seja investimento bioenergético no desenvolvimento individual, na aprendizagem e no bem colectivo. Na minha opinião devemos procurar um modelo alternativo ao actual que está baseado em instituições que corrompem as condições de emancipação da maior parte da população através de mecanismos financeiros e de controlo de recursos, é um modelo baseado no esgotamento de possibilidades superiores da actividade humana, a todos os níveis.
- 25 de janeiro de 2010 às 14:15
- paula disse...
-
Apoiado!
E se nos desempregassemos? (a questão é séria!) - 25 de janeiro de 2010 às 14:31
- Anónimo disse...
-
acho que teríamos que "trabalhar" noutro sentido: necessitamos de não esquecer a experiência das gerações anteriores, as dificuldades que passaram, sobretudo durante a ditadura, por não ter acesso a meios de subsistência nem a informação, não esquecer os bons conhecimentos que temos, e lutar por um futuro melhor:
Apoio completamente a ideia de curta a dependência de megacorporações e bancos centrais e instituições afins, mas isso tem de ser feito de uma maneira inteligente, não é possível isso, se não existir o sustento de meios de sobrevivência básica, ideias reais e mecanismos que nos permitam lutar por uma sociedade melhor. - 25 de janeiro de 2010 às 14:47
- ana disse...
-
Texto de grande lucidez , a questão será então como achar alternativas...
- 25 de janeiro de 2010 às 21:06
- paula disse...
-
Como refundar o trabalho?
Como criar um modelo alternativo em que as pessoas possam de forma não coerciva, mas criativa, gerir o seu tempo de trabalho e a sua capacidade de actividade? Será que o abandono voluntário desta forma de trabalho servil resultaria numa desordem civil e individual? Mas essa desordem interna e externa já existe e é altamente prejudicial ao ser humano e à natureza.Ou as pessoas já estão suficientemente evoluidas para se organizarem em modelos comunitários de auto gestão? Cada um tem um potencial fantástico de vontade de fazer coisas, de aprender, de criar, de realização. Acabar com esta forma de trabalho não é um apelo à inércia, pelo contrário. É possibilitar uma realização consciente e feliz disso que cada um gosta e quer fazer, mas que não faz, pois tem de ir "trabalhar". E aqueles que ainda não conhecem as suas potencialidades criativas, sempre poderiam cooperar com outros mais determinados.
Enfim, acredito que o ser humano tem realmente potencial para se refundar completamente, é necessário apenas acreditar! - 26 de janeiro de 2010 às 12:04
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Manifesto
Aqui se apresenta a proposta de um cidadão português que, no decurso da sua docência universitária, obra publicada e intervenção cultural, tem seguido com interesse e preocupação os rumos recentes de Portugal e do mundo. Convicto de que urge refundar Portugal, eis uma lista de prioridades para o país e o mundo melhor a que temos direito e que todos temos o dever de construir. Agradecem-se os contributos críticos, de modo a que a proposta se aperfeiçoe e complete e sirva de plataforma para a discussão pública e a intervenção cultural e cívica que visa, pelos meios que se verificarem ser os mais oportunos.
I – Portugal é uma nação que, pela diáspora planetária da sua história e cultura, pela situação geográfica e pela língua, com 240 milhões de falantes em toda a comunidade lusófona, tem a potencialidade de ser uma nação cosmopolita, uma nação de todo o mundo, que estabeleça pontes, mediações e diálogos entre todos os povos, culturas e civilizações. Este perfil vocaciona-nos para o cultivo dos valores mais universalistas, promovendo o diálogo com todas as culturas mundiais. Os valores mais universalistas são aqueles que promovam o melhor possível para todos, uma cultura da paz, da compreensão e da fraternidade à escala planetária, visando não apenas o bem da espécie humana, mas também a preservação da natureza e do bem-estar de todas as formas de vida animal, como condição da própria qualidade e dignidade da vida humana.
II – O nosso potencial universalista tem sido sistematicamente ignorado pelas nossas orientações governativas, desde a época dos Descobrimentos até hoje. Se no passado predominou a pretensão de dilatar a Fé e o Império, hoje predomina a sujeição da nação aos novos senhores do mundo, as grandes esferas de interesses político-económicos. Portugal está ao serviço da globalização de um paradigma de desenvolvimento económico-tecnológico que explora desenfreadamente os recursos naturais e instrumentaliza homens e animais, donde resulta um enorme sofrimento, um fosso crescente entre homens, classes, povos e nações, a redução da biodiversidade e o arrastar do planeta para uma crise sem precedentes.
III – A assunção do nosso potencial universalista implica uma reforma das mentalidades, com plena expressão ética, cultural, social, política e económica. Nesse sentido se propõem as seguintes medidas urgentes, que visam implementar entre nós um novo paradigma, convergente com as melhores aspirações humanas e com os grandes desafios deste início do século XXI:
1 – Portugal deve dar prioridade absoluta a um desenvolvimento económico sustentado, que salvaguarde a harmonia ecológica e o bem-estar da população humana e animal. A Constituição da República Portuguesa deve consagrar a senciência dos animais – a sua capacidade de sentir dor e prazer - e o seu direito à vida e ao bem-estar. Portugal deve aprender com a legislação das nações europeias mais evoluídas neste domínio, adaptando-a à realidade nacional.
2 – Portugal deve ensaiar modelos de desenvolvimento alternativos, que preservem e promovam a diversidade cultural, biológica e ecoregional. Há que promover a sustentabilidade económica do país, desenvolvendo as economias locais. Devem-se substituir quanto possível as energias não-renováveis (petróleo, carvão, gás natural, energia nuclear), por energias renováveis e alternativas (solar, eólica, hidráulica, marmotriz, etc.), superando o paradigma, a vulnerabilidade e as dependências de uma economia baseada no petróleo e nos hidrocarbonetos. Deve-se particularmente explorar as potencialidades energéticas dos nossos mais de 900 km de costa.
3 - Devem-se ensaiar formas de organização económica cujo objectivo fundamental não seja apenas o lucro financeiro. Deve-se assegurar o predomínio da ética e da política sobre a economia, de modo a que a produção e distribuição da riqueza vise o bem comum do ecossistema e dos seres vivos, a satisfação das necessidades básicas dos homens e a melhoria geral da sua qualidade de vida, bem como o acesso de todos à educação e à cultura.
4 - Deve-se investir num programa pedagógico de redução das necessidades artificiais que permita oferecer alternativas ao produtivismo e consumismo, fazendo do trabalho e do desenvolvimento económico não um fim em si, com o inevitável dano da harmonia ecológica, da biodiversidade e do bem-estar de homens e animais, mas um mero meio para a fruição de um crescente tempo livre de modo mais gratificante e criativo. Deve-se fiscalizar mais rigorosamente o crédito ao consumo, de forma a evitar o crescente endividamento das famílias.
5 – Há que criar um serviço público de saúde eficiente e acessível a todos, que inclua a possibilidade de optar por medicinas e terapias alternativas, de qualidade e eficácia comprovada, como a homeopatia, a acupunctura, a osteopatia, o shiatsu, o yoga, a meditação, etc. Estas opções, bem como os medicamentos naturais e alternativos, devem ser igualmente comparticipadas pelo Estado.
6 – Importa informar e sensibilizar a população para os efeitos nocivos de vários hábitos alimentares - nomeadamente o consumo excessivo de carne - , para o meio ambiente, a saúde pública e o bem-estar de homens e animais. Sendo uma das principais causas do aquecimento global, do esgotamento dos recursos naturais e do sofrimento dos animais, há que restringir e criar alternativas à agropecuária intensiva. Deve-se divulgar a possibilidade de se viver saudavelmente com uma alimentação não-carnívora, vegetariana ou vegan e devem-se reduzir os impostos sobre os produtos de origem natural e biológica.
7 - Portugal, a par do desenvolvimento económico sustentado, deve investir sobretudo nos domínios da saúde, da educação e da cultura, não só tecnológica, mas filosófica, literária, artística e científica. O Orçamento do Estado deve reflectir isso, reduzindo os gastos com a Defesa, o Exército e as obras públicas de fachada. Urge moralizar e reduzir os salários e reformas de presidentes, ministros, deputados e detentores de cargos na administração pública e privada, a par do aumento dos impostos sobre os grandes rendimentos.
8 - Redignificar, com exigência, os professores e todos os profissionais ligados à educação e à cultura. A educação e a cultura não devem estar dependentes de critérios economicistas e das flutuações do mercado de emprego. Os vários níveis de ensino visarão a formação integral da pessoa, não a sacrificando a uma mera funcionalização profissional. A par disto, há que sensibilizar as famílias para não abandonarem as crianças em frente dos computadores e dos maus programas de televisão. A televisão pública deve melhorar o seu nível, investindo mais em programas de informação e formação.
Nos vários níveis de ensino deve ser introduzida uma disciplina que sensibilize para o respeito pela natureza, a vida humana e a vida animal, bem como outra que informe sobre a diversidade de paradigmas culturais, morais e religiosos coexistentes nas sociedades contemporâneas. Nos mesmos níveis de ensino deve estar presente a cultura portuguesa e lusófona, bem como as várias culturas planetárias. Um português culto e bem formado deve ter uma consciência lusófona e universal, não apenas europeia-ocidental.
A meditação, com benefícios científicamente reconhecidos - quanto ao equilíbrio e saúde psicofisiológicos, ao aumento da concentração e da memória, à melhoria na aprendizagem, à maior eficiência no trabalho e à harmonia nas relações humanas - , deve ser facultada em todos os níveis dos currículos escolares, em termos puramente laicos, sem qualquer componente religiosa.
9 - Portugal deve assumir-se na primeira linha da defesa dos direitos humanos e dos seres vivos em todos os pontos do planeta em que sejam violados, sem obedecer a pressões políticas ou económicas internacionais. Portugal deve ser um lugar de bom acolhimento para todos os emigrantes e estrangeiros que o procurem para trabalhar e viver.
10 – Portugal deve aprofundar as relações culturais, económicas e políticas com as nações de língua portuguesa, incluindo a região da Galiza, Goa, Damão, Diu, Macau e os outros lugares da nossa diáspora onde se fala o português, sensibilizando a comunidade lusófona para as causas universais, ambientais, humanitárias e animais.
11 - Portugal deve promover a Lusofonia e os valores universalistas da cultura portuguesa e lusófona no mundo, dando o seu melhor exemplo e contributo para converter a sociedade planetária na possível comunidade ético-cultural e ecuménica visada entre nós por Luís de Camões, Padre António Vieira, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva. Portugal deve assumir-se como um espaço multicultural e de convivência com a diversidade, um espaço privilegiado para o tão actual desafio do diálogo intercultural e inter-religioso, alargado ao diálogo entre crentes e descrentes. Deve precaver-se contudo de tentações neo-imperialistas e de qualquer nacionalismo lusófono ou lusocêntrico. A Lusofonia não deve abafar outras línguas e culturas que existam no seu espaço.
12 - Verifica-se haver em Portugal e na Europa em geral uma grave crise de representação eleitoral, patente na elevada abstenção e descrédito dos políticos, dos partidos e da política, os quais, segundo a opinião geral, apenas promovem o acesso ao poder de indivíduos e grupos que sacrificam o bem comum a interesses pessoais e particulares, com destaque para os das grandes forças económicas. As eleições são assim sistematicamente ganhas por representantes de minorias, relativamente à totalidade dos cidadãos eleitores, que governam isolados da maioria real das populações, que os consideram com alheamento, desconfiança e desprezo, tornando-se vítimas passivas das suas políticas. O actual sistema eleitoral também não promove a melhor justiça representativa, não facilitando a representação de uma maior diversidade de forças políticas e limitando-a às organizações partidárias, o que contribui para a instrumentalização do aparelho de Estado, dos lugares de decisão político-económica e da comunicação social pelos grandes partidos.
Esta é uma situação que compromete seriamente a democracia e que a história ensina anteceder todas as tentativas de soluções ditatoriais. Há que regenerar a democracia em Portugal, reformando o estado e o sistema eleitoral segundo modelos que fomentem a mais ampla participação e intervenção política da sociedade civil, facilitando a representação de novas forças políticas e possibilitando que cidadãos independentes concorram às eleições. Deve-se recuperar a tradição municipalista portuguesa e promover uma regionalização e descentralização administrativa equilibradas, assegurando mecanismos de prevenção e controlo dos despotismos locais.
Há que colocar a política ao serviço da ética e da cultura e mobilizar a população para a intervenção cívica e política em torno dos desafios fundamentais do nosso tempo, com destaque para a protecção da natureza, o bem-estar dos seres vivos e uma nova consciência planetária. Há que mobilizar os cidadãos indiferentes e descrentes da vida política, a enorme percentagem de abstencionistas e todos aqueles que se limitam a votar, para a responsabilidade de reflectirem, discutirem e criarem o melhor destino a dar à nação. Há que, dentro dos quadros democráticos e legais, promover formas alternativas de intervenção cultural, social e cívica, que permitam antecipar tanto quanto possível a realidade desejada, sem depender dos poderes instituídos.
Convicto de que estas medidas permitirão que Portugal recupere o pioneirismo e criatividade que o caracterizou no impulso dos Descobrimentos, mas agora sem escravizar e explorar outros povos, apelo a que todos dêem o vosso contributo para a discussão, aperfeiçoamento e divulgação deste Manifesto. De todos nós depende que ele se constitua na plataforma de um movimento cívico e cultural de reflexão e acção, que nos arranque ao comodismo e passividade em que estamos instalados.
Por um Outro Portugal!
Contribuidores
- Ana Moreira
- Ana Rodrigues
- Bernardo Almeida
- Dr Carlos Gonçalves
- Duarte D. Braga
- Duarte
- Estudo Geral
- Fernando Emídio
- Gil
- Helena Caetano
- Isabel Rosete
- Isabel Santiago
- João Beato
- João Lopes Aguiar
- José Magalhães
- Luís Miguel Dantas
- Luis Resina
- Luis Resina
- MJC
- Margarida
- Maria de Lourdes Teixeira Puga Alvarez
- Maribel Sobreira
- Maurícia Teles da Silva
- Minda
- Moysés
- P.F. Antunes
- Paulo Borges
- Pedro Miguel Estrela
- Pedro Paz
- Pedro Sena
- Rui Matoso
- Rute Pinheiro
- Sérgio Mago
- Unknown
- aluzdascasas
- ana
- castus
- ethel
- jads
- lurdes
- maria alvarez
- paula
5 comentários:
Simplificando (demasiado?): O "trabalho" em si não é a causa de mal. Mas o "trabalhador" enquanto se constitui como sujeito de relações de poder instituídas. A questão será constituir um modelo de agir em que o trabalho seja investimento bioenergético no desenvolvimento individual, na aprendizagem e no bem colectivo. Na minha opinião devemos procurar um modelo alternativo ao actual que está baseado em instituições que corrompem as condições de emancipação da maior parte da população através de mecanismos financeiros e de controlo de recursos, é um modelo baseado no esgotamento de possibilidades superiores da actividade humana, a todos os níveis.
Apoiado!
E se nos desempregassemos? (a questão é séria!)
acho que teríamos que "trabalhar" noutro sentido: necessitamos de não esquecer a experiência das gerações anteriores, as dificuldades que passaram, sobretudo durante a ditadura, por não ter acesso a meios de subsistência nem a informação, não esquecer os bons conhecimentos que temos, e lutar por um futuro melhor:
Apoio completamente a ideia de curta a dependência de megacorporações e bancos centrais e instituições afins, mas isso tem de ser feito de uma maneira inteligente, não é possível isso, se não existir o sustento de meios de sobrevivência básica, ideias reais e mecanismos que nos permitam lutar por uma sociedade melhor.
Texto de grande lucidez , a questão será então como achar alternativas...
Como refundar o trabalho?
Como criar um modelo alternativo em que as pessoas possam de forma não coerciva, mas criativa, gerir o seu tempo de trabalho e a sua capacidade de actividade? Será que o abandono voluntário desta forma de trabalho servil resultaria numa desordem civil e individual? Mas essa desordem interna e externa já existe e é altamente prejudicial ao ser humano e à natureza.Ou as pessoas já estão suficientemente evoluidas para se organizarem em modelos comunitários de auto gestão? Cada um tem um potencial fantástico de vontade de fazer coisas, de aprender, de criar, de realização. Acabar com esta forma de trabalho não é um apelo à inércia, pelo contrário. É possibilitar uma realização consciente e feliz disso que cada um gosta e quer fazer, mas que não faz, pois tem de ir "trabalhar". E aqueles que ainda não conhecem as suas potencialidades criativas, sempre poderiam cooperar com outros mais determinados.
Enfim, acredito que o ser humano tem realmente potencial para se refundar completamente, é necessário apenas acreditar!
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